O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade
ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores - PT e pelo Partido Democrático
Trabalhista - PDT contra a Lei 9.637/98 — que dispõe sobre a qualificação como
organizações sociais de pessoas jurídicas de direito privado, a criação do
Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que
mencionam, a absorção de suas atividades por organizações sociais, e dá outras
providências — e contra o inciso XXIV do art. 24 da Lei 8.666/93, com a redação
dada pelo art. 1º da Lei 9.648/98, que autoriza a celebração de contratos de
prestação de serviços com organizações sociais, sem licitação. O Min. Ayres
Britto, relator, julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a
inconstitucionalidade das seguintes expressões e dispositivos da Lei 9.637/98:
da expressão “quanto à conveniência e oportunidade de sua qualificação como
organização social”, contida no inciso II do art. 2º; da expressão “com
recursos provenientes do contrato de gestão, ressalvada a hipótese de adicional
relativo ao exercício de função temporária de direção e assessoria”,
constante do § 2º do art. 14; dos artigos 18 a 22, com modulação dos efeitos da decisão
no sentido de que as organizações sociais que “absorveram” atividades de
entidades públicas extintas até a data do julgamento deverão continuar prestando
os respectivos serviços. Deu, ainda, aos artigos 5º, 6º e 7º do mesmo diploma e
ao inciso XXIV do art. 24 da Lei 8.666/93, interpretação conforme a
Constituição, para deles afastar qualquer entendimento excludente da realização
de um peculiar processo competitivo público e objetivo para: a) a qualificação
de entidade privada como organização social; b) a celebração de “contrato de
gestão”.
ADI
1923/DF, rel. Min. Ayres Britto, 31.3.2011. (ADI-1923)
Organizações Sociais e contrato de
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O relator, após fazer um apanhado sobre os preceitos constitucionais
relativos ao regime dos serviços públicos, consignou a possibilidade de
prestação não-estatal. Ressaltou que os serviços prestados tanto pelo setor
público — diretamente ou sob regime de concessão, permissão ou autorização —
quanto os prestados pela iniciativa privada possuiriam natureza pública, uma
vez que o serviço não se despublicizaria pelo fato do transpasse de sua prestação
ao setor privado. No tocante às atividades de senhorio misto, realçou que
teriam natureza pública, se prestadas pelo próprio Estado ou em parceria com o
setor privado e, se desempenhadas exclusivamente pelo setor privado, seriam
definidas como atividades ou serviços de relevância pública (CF, artigos 129,
II, e 197). Tendo em conta esse contexto normativo, concluiu que os
particulares poderiam desempenhar atividades que também corresponderiam a deveres
do Estado, mas que não seriam exclusivamente públicas, a exemplo da cultura, saúde,
ciência e tecnologia, educação e do meio ambiente. Aduziu que tais atividades
seriam passíveis de financiamento público e sob a cláusula da atuação apenas
complementar do setor público.
ADI
1923/DF, rel. Min. Ayres Britto, 31.3.2011. (ADI-1923)
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gestão - 3
Assim, reputou inconstitucional o chamado “Plano Nacional de
Publicização” previsto na lei impugnada, haja vista que, na realidade, tratar-se-ia
de um programa de privatização. Explicou, no ponto, que órgãos e entidades públicos
seriam extintos ou desativados e todos os seus bens, servidores e recursos
orçamentários seriam repassados à gestão das organizações sociais. Reiterou que
a Constituição determina, quanto aos serviços estritamente públicos, que o
Estado os preste diretamente ou sob regime de concessão, permissão ou
autorização. Dessa forma, expôs que os artigos 18 a 22 da Lei 9.637/98 — ao
estabelecerem um mecanismo pelo qual o Estado poderia transferir para a
iniciativa privada toda a prestação de serviços públicos de saúde, educação, meio
ambiente, cultura, ciência e tecnologia — autorizariam o Estado a abdicar da
prestação de serviços dos quais ele não poderia se demitir, sem que
configurasse terceirização de funções que lhe seriam típicas. Relembrou que
organização social não seria pessoa integrante da Administração Pública e que,
se permitida tal “absorção”, o Estado passaria a exercer, nos serviços
públicos, o mesmo papel que desempenha na atividade econômica: o de agente
indutor, fiscalizador e regulador, em frontal descompasso com a vontade objetiva
da Constituição. De outro lado, não vislumbrou mácula no mecanismo de parceria
entre o Estado e os particulares relativamente aos serviços enumerados no art.
1º da lei questionada, dado que não seriam exclusivos do Estado.
ADI
1923/DF, rel. Min. Ayres Britto, 31.3.2011. (ADI-1923)
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Assinalou que o “contrato de gestão” firmado com tais entidades
consistiria, em linhas gerais, em convênio, caracterizado por interesses
recíprocos e convergentes. Portanto, em princípio, considerou desnecessária a
realização de processo licitatório para a sua celebração e, em conseqüência,
constitucional o inciso XXIV do art. 24 da Lei 8.666/93. Entretanto, o relator
ressalvou que isso: a) não afastaria o dever de abertura de processo administrativo
que demonstrasse, objetivamente, em que o regime da parceria com a iniciativa privada
se revelaria como de superior qualidade frente à atuação isolada ou solitária
do próprio Estado enquanto titular da atividade em questão; b) não liberaria a
Administração da rigorosa observância dos princípios constitucionais da
publicidade, da moralidade, da impessoalidade, da eficiência e da garantia de
um processo objetivo e público para a qualificação das entidades como organizações
sociais e sua específica habilitação para determinado “contrato de gestão”; c)
não prescindiria de motivação administrativa quanto à seleção de uma
determinada pessoa privada, se houver outra com idêntica pretensão de
emparceiramento com o Poder Público; d) não dispensaria os mecanismos de
controle interno e externo sobre o serviço ou atividade em regime de parceria
com a iniciativa privada. Salientou, em suma, que se deveria proceder a um chamamento
público, com regras objetivas, a fim de se convocar, dentre as organizações
sociais com atuação na área, aquela com maior aptidão para realizar a atividade
pretendida.
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1923/DF, rel. Min. Ayres Britto, 31.3.2011. (ADI-1923)
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Reconheceu a inconstitucionalidade do fraseado “quanto à
conveniência e oportunidade de sua qualificação como organização social”,
inserto no inciso II do art. 2º da Lei 9.637/98. E no que tange ao contrato de
gestão (artigos 5º a 7º), explicitou, via interpretação conforme a Constituição,
que a ausência de um processo público e objetivo para a celebração do “contrato
de gestão” — não, necessariamente, de um processo licitatório —, implicaria
ofensa aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade,
eficiência, economicidade e isonomia. Rejeitou, ademais, as alegações de
inconstitucionalidade dos incisos V, VII e VIII do art. 4º, do inc. II do art.
7º e do art. 14, todos da lei adversada. Destacou que as organizações sociais
não se caracterizariam como parcela da Administração Pública e que seus
diretores e empregados não seriam servidores ou empregados públicos. Por
conseguinte, mesmo sujeitas a procedimento impessoal na seleção dos empregados
e na fixação dos respectivos salários, não haveria que se falar em concurso
público ou remuneração fixada por lei. Evidenciou que o mesmo entendimento,
contudo, não seria aplicável aos servidores públicos cedidos (Lei 9.637/98,
art. 14), sendo inconstitucional o § 1º do art. 14 dessa lei, atinente a cessão
especial “com ônus para a origem”, na parte em que permitiria à pessoa
jurídica privada pagar vantagem pecuniária a servidor público, sem que lei
específica o autorizasse. Acrescentou que a parte final do § 2º do mesmo
artigo, ao prever o pagamento de “adicional relativo ao exercício de função temporária
de direção e assessoria” com recursos públicos, além de afrontar o inciso X
do art. 37 da CF, vulneraria o § 1º de seu art. 169. Nesse sentido, julgou
inconstitucional a expressão “com recursos provenientes do contrato de
gestão, ressalvada a hipótese de adicional relativo ao exercício de função
temporária de direção e assessoria”, disposta no § 2º do art. 14 da Lei
9.637/98. Por essa razão e por ficar vedado o pagamento pela organização social
de qualquer vantagem pecuniária a servidor público cedido, declarou a
inconstitucionalidade, por arrastamento, do § 1º do mesmo art. 14. Por fim,
propôs a modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade quanto aos
artigos 18 a
22 da lei vergastada ao fundamento de que esta vigoraria há mais de 12 anos,
que a Corte teria indeferido o pedido de medida cautelar e que não seria
razoável a desconstituição de situações de fato que adquiriram contornos de
extratificação. Após, pediu vista dos autos o Min. Luiz Fux.
ADI 1923/DF, rel. Min. Ayres Britto, 31.3.2011. (ADI-1923)
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