terça-feira, 17 de maio de 2016

Jurisprudência Comentada - Processo Penal

Eventuais vícios no inquérito policial são capazes de causar a nulidade da ação penal?



O inquérito policial pode ser conceituado, verbis:

Inquérito é o ato ou efeito de inquirir, isto é, procurar informações sobre algo, colher informações acerca de um fato, perquirir. O CPP de 1941 denomina a investigação preliminar de inquérito policial em clara alusão ao órgão encarregado da atividade. O inquérito policial é realizado pela polícia judiciária, que será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria (art. 4º). (LOPES JR, 2012) 

A natureza jurídica do inquérito policial é de procedimento administrativo, visto que há o encadeamento sequencial de atos com a finalidade de produzir elementos de informação de modo a apurar a autoria e materialidade do delito praticado. Além disso, a autoridade encarregada pela sua presidência é o Delegado de Polícia que não obstante exerça função jurídica é uma autoridade administrativa já que ele atua em uma fase pré-processual. 
Art. 2o da Lei 12.830 As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
§ 1o Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.
A nulidade do inquérito policial tem o condão de nulificar a ação penal?

A posição minoritária defende que o inquérito policial pode causar a nulidade da ação penal, visto que os princípios constitucionais que asseguram as regra do jogo (devido processo legal, legalidade etc) incidem em qualquer espécie de procedimento seja administrativo ou processual. Frisa-se, ainda, as repercussões danosas que o inquérito policial pode causar como a prisão do investigado, a constrição de bens e até mesmo sua condenação.
O fato de o inquérito ter natureza administrativa não é um argumento válido, pois não o blinda contra as garantias processuais e constitucionais, na medida em que o próprio artigo 5º, LV da Constituição Federal estende a incidência à fase de investigação. Ademais, o princípio do devido processo legal tem plena incidência em qualquer procedimento ou processo administrativo (ou por acaso o direito administrativo e os respectivos procedimentos não reconhecem nulidades?). Mais do que nunca, qualquer procedimento administrativo é pautado pela estrita legalidade dos atos da administração. (...) Sem falar que também serve para condenar pessoas... Ou não? Na medida em que o artigo 155 do CPP autoriza (gostemos ou não) que o juiz se baseie também no inquérito para condenar (não pode é ser “exclusivamente”...o que representa uma fraude conceitual evidente), é claro que ele acaba adquirindo valor probatório. Sem falar no tribunal do júri, em que (absurdamente) os jurados decidem por “íntima e imotivada” convicção. Leia-se: podem condenar exclusivamente com base no inquérito (e até fora dele e do processo...). Alguém vai seguir com o discurso de peça meramente informativa à luz dessa realidade? (LOPES JR, 2014)
Por outro lado, a posição majoritária afirma que o inquérito policial é mera peça informativa que subsidiará a ação penal de modo que nele não incidem os princípios da ampla defesa e do contraditório.



O STF e STJ têm entendimentos uniformes no sentido que o vício no inquérito policial não é capaz de causar a nulidade do processo.
Vício em inquérito policial e nulidade de ação penal
É incabível a anulação de processo penal em razão de suposta irregularidade verificada em inquérito policial. Esse o entendimento da Segunda Turma, que, ao reafirmar a jurisprudência assentada na matéria, negou provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” em que se pleiteava a anulação de atos praticados em inquérito policial presidido por delegado alegadamente suspeito. Precedentes citados: RHC 43.878/SP (DJU de 5.4.1967) e HC 73.271/SP (DJU de 4.10.1996).RHC 131450/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 3.5.2016. (RHC-131450)
 RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO OFERECIDA NA FASE POLICIAL. IRRELEVÂNCIA. CRIME PERSEGUIDO MEDIANTE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. POSSIBILIDADE DE APURAÇÃO DE OFÍCIO PELA AUTORIDADE POLICIAL E DE OFERECIMENTO DE DENÚNCIA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM BASE EM QUAISQUER ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO QUE POSSUIR. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO DE REQUERIMENTO FORMULADO PELO RÉU NA FASE INQUISITORIAL. INEXISTÊNCIA DE CONTAMINAÇÃO DO PROCESSO EM RAZÃO DE EVENTUAIS VÍCIOS OCORRIDOS NA FASE EXTRAJUDICIAL.  COAÇÃO ILEGAL INEXISTENTE. DESPROVIMENTO DO RECLAMO.1. O crime imputado ao recorrente não se enquadra em quaisquer das hipóteses previstas no artigo 182 do Código Penal, sendo perseguido por meio de ação penal pública incondicionada, o que revela que o início da persecução penal não depende da representação de quem quer que seja.2. Nos termos do artigo 5º do Código de Processo Penal, nos crimes de ação penal pública o inquérito policial pode ser iniciado até mesmo de ofício, sendo certo, outrossim, que o Ministério público não depende do procedimento inquisitorial para o oferecimento de denúncia, que pode estar subsidiada em quaisquer elementos de informação que o órgão acusatório possuir.3. O inquérito policial é peça meramente informativa, na qual não imperam os princípios do contraditório e da ampla defesa, motivo pelo qual eventuais vícios ou irregularidades ocorridos no seu curso não têm o condão de macular a ação penal. Precedente.4. Recurso desprovido.(RHC 68.592/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 04/05/2016)

Referência Bibliográfica

LOPES JR, Aury. Direito processual penal – 9. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2012.

LOPES JR, Aury. LIMITE PENAL. Nulidades e ilicitudes do Inquérito não contaminam o Processo Penal? Disponível em:< http://www.conjur.com.br/2014-dez-19/limite-penal-nulidades-ilicitudes-inquerito-nao-contaminam-processo-penal />. Acesso em: 17 de maio. 2016.

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