O Plenário retomou julgamento conjunto de
ações diretas em que impugnados dispositivos inseridos no texto constitucional
por meio da Emenda Constitucional 41/2003, denominada “Reforma Constitucional
da Previdência”. Na assentada, foram julgados dispositivos questionados pela
Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, pela Confederação dos Servidores
Públicos do Brasil - CSPB e pelo Partido da República. De início, foram
analisados o art. 40, caput, da CF, e o art.
4º, caput e §§ 1º e 2º, da
referida emenda. Reputou-se que a matéria já teria sido apreciada pela Corte,
(ADI 3105/DF e ADI 3128/DF, DJU de 18.2.2005), razão pela qual se julgou o
pedido prejudicado em relação a esses dispositivos. No tocante ao art. 40, §
7º, I e II, da CF (“§
7º Lei disporá sobre a concessão do benefício de pensão por morte, que será
igual: ... I - ao valor da totalidade dos proventos do servidor falecido, até o
limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência
social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por cento da parcela
excedente a este limite, caso aposentado à data do óbito; ou ... II - ao valor
da totalidade da remuneração do servidor no cargo efetivo em que se deu o
falecimento, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime
geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por
cento da parcela excedente a este limite, caso em atividade na data do óbito”), a Min. Cármen
Lúcia, relatora, declarou a sua constitucionalidade. Aduziu que os limites
estabelecidos nos incisos adversados seriam aplicáveis tão-somente às pensões
por morte instituídas após a promulgação da emenda constitucional de que se
cuida, ou seja, tratariam apenas da situação concretamente considerada, em que
o valor do benefício seria irredutível desde que tomada como parâmetro legal para
seu cálculo a legislação em vigor à época do óbito. Afirmou que essa assertiva
seria aferível a partir da taxatividade com que o art. 194, parágrafo único,
IV, da CF (“Art. 194.
... Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos: ... IV - irredutibilidade
do valor dos benefícios”) vedara a possibilidade de redução de benefícios
previdenciários instituídos em favor dos dependentes do segurado, bem como da
ressalva contida no art. 3º da EC 41/2003 (“É assegurada a concessão, a qualquer tempo, de
aposentadoria aos servidores públicos, bem como pensão aos seus dependentes,
que, até a data de publicação desta Emenda, tenham cumprido todos os requisitos
para obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação então
vigente”).
Após o voto do Min. Luiz Fux, nesse mesmo sentido, pediu vista, no ponto, o
Min. Ayres Britto.
ADI e “Reforma Constitucional da Previdência” - 4
Em seguida, passou-se à análise do art. 40, § 18, da CF (“§ 18 Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos”). A relatora julgou o pedido improcedente. Frisou que a Corte, ao declarar a inconstitucionalidade dos percentuais estabelecidos nos incisos I e II e no parágrafo único do art. 4º da EC 41/2003, afirmara o caráter geral do art. 40, § 18, da CF. Consignou que a discriminação determinada pela norma segundo a qual incidirá contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadorias e pensões que excederem o limite máximo fixado para os benefícios do regime geral de previdência configuraria situação justificadamente favorável àqueles que já recebiam benefícios quando do advento da EC 41/2003, incluídos no rol dos contribuintes. Ressaltou que, na espécie, se por um lado, a contribuição devida pelos servidores da ativa seria calculada com base na totalidade dos vencimentos percebidos, por outro, inativos e pensionistas teriam o valor de sua contribuição fixado sobre base de cálculo inferior, pois dela seria extraído valor equivalente ao teto dos benefícios pagos no regime geral. Desse modo, haveria proporcionalidade, visto que os inativos, por não poderem fruir do sistema da mesma forma que os ativos, não seriam tributados com a mesma intensidade. No ponto, o Min. Marco Aurélio divergiu, para julgar o pleito procedente. Considerou que situações assentadas segundo o regime anterior não poderiam ser alcançadas pelo tributo. Assim, aposentados que, em atividade, não contribuíram para o sistema, não poderiam, uma vez inativos, passar a contribuir. Ademais, a circunstância de o preceito haver previsto a incidência do tributo apenas relativamente a valores que superem os do regime geral não afastaria do cenário a incidência do dispositivo quanto às situações constituídas. Após os votos dos Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, que acompanharam a relatora, pediu vista, apenas em relação ao art. 40, § 18, da CF, o Min. Ayres Britto.
ADI e “Reforma Constitucional da Previdência” - 5
Ato contínuo, a Corte
examinou o art. 5º da EC 41/2003. A respeito, não se conheceu do pedido, em
razão de inobservância do que exigido no art. 3º, I, da Lei 9.868/99. Após, em
relação ao art. 9º da EC 41/2003 (“Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e
subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração
direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato
eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie
remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens
pessoais ou de qualquer outra natureza”), a relatora e os Ministros Luiz
Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes julgaram a pretensão procedente, para dar
interpretação conforme ao preceito, de modo que ele seja interpretado no
contexto da emenda. O Min. Gilmar Mendes salientou que esse artigo seria norma
expletiva, a enfatizar a existência do limite imposto pelo art. 37, XI, da CF.
Evitar-se-ia, então, que o teto fosse superado, independentemente do regime a
que o servidor estivesse submetido: anterior ou posterior à EC 41/2003. De
outro lado, os Ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto,
Celso de Mello e Presidente julgaram procedente o pedido. O Presidente
asseverou que os direitos adquiridos desde o início da vigência da Constituição
até a data da EC 41/2003 não poderiam ser alcançados por uma norma
constitucional superveniente, editada pelo constituinte derivado. Assim, o art.
9º da aludida emenda seria inconstitucional na medida em que determina a
aplicação do art. 17 do ADCT (“Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as
vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam
sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos
aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de
direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título. ... § 1º - É
assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de
médico que estejam sendo exercidos por médico militar na administração pública
direta ou indireta. ... § 2º - É assegurado o exercício cumulativo de dois
cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo
exercidos na administração pública direta ou indireta”) a situações estabelecidas
na vigência da Constituição, portanto não transitórias. A respeito, o Min.
Celso de Mello lembrou que emendas constitucionais não poderiam ofender o
direito adquirido, por limitação material imposta pelo art. 60, § 4º, IV, da CF
(“§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir: ... IV - os direitos e garantias individuais”). O Min. Ricardo
Lewandowski apontou que o art. 9º da EC 41/2003 abrangeria apenas situações
anteriores à CF/88, de modo que a menção expressa ao art. 17 do ADCT —
referente a eventos pretéritos — seria uma séria deficiência técnica na redação
do dispositivo. Destacou, ainda, que a mantença desse artigo na ordem jurídica
poderia implicar conflito interpretativo com o art. 3º da EC 41/2003.
ADI e “Reforma Constitucional da Previdência” - 6
O Presidente sublinhou,
ainda, que, na hipótese de superação do teto constitucional, a revogação desse
direito adquirido poder-se-ia realizar por meio da aplicação das normas
constitucionais, como o art. 37, XI, da CF (“XI - a remuneração e o subsídio
dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta,
autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato
eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie
remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens
pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal,
em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como
limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito
Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o
subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e
o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa
inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie,
dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário,
aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos
Defensores Públicos”). Portanto, o art. 9º da EC 41/2003 seria mera
reiteração das normas permanentes, voltado, entretanto, para alcançar situações
constituídas sob o regime anterior à emenda e, dessa forma, abrir exceção às
garantias constitucionais do direito adquirido e da coisa julgada. Haveria,
então, o risco de a Administração Pública usar o art. 17 do ADCT para
desconhecer direitos adquiridos sob as garantias constitucionais vigentes.
Após, deliberou-se pela suspensão do julgamento.
Serviços notariais e de registros: reorganização e
reconhecimento de vício - 1
Por estar configurada situação
constitucional imperfeita, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido
formulado em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pela Associação dos
Notários e Registradores do Brasil - Anoreg/BR, contra os Provimentos 747/2000
e 750/2001, ambos do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo.
Os referidos atos reorganizaram as serventias notariais e de registros no
interior daquele ente federativo “mediante a acumulação e desacumulação de serviços, extinção
e criação de unidades”. Prevaleceu o voto do Min. Ayres Britto, relator, que, de
início, anotou estarem apensadas a estes autos a ADI 2419/SP e a ADI 2476/ SP,
propostas pelo Partido Trabalhista Brasileiro - PTB e pela Mesa da Assembléia
Legislativa do Estado de São Paulo, respectivamente. Após, discorreu sobre os
serviços notariais e de registros, destacando, ainda, que eles teriam regime
jurídico constitucional e compor-se-iam de um feixe de competências públicas,
embora exercidas por delegação a pessoa privada. Em seguida, ponderou que —
embora estivesse inclinado a exigir o princípio da reserva de lei para a ampla
estruturação processada nas unidades aludidas, o que levaria a concluir pela
inconstitucionalidade dos provimentos — o contexto seria singularíssimo e,
assim também, a decisão liminar proferida. Acrescentou que, desde a propositura
da ação, muitos concursos foram realizados com várias delegações outorgadas
naquela localidade. No ponto, o Min. Celso de Mello assinalou que, há 10 anos,
quando o STF apreciara o pleito de medida cautelar, existia, realmente, no que
concerne a essa matéria, um estado de dúvida que se refletira no debate então
efetuado e na própria síntese do julgamento exposta na ementa consubstanciadora
daquela decisão.
ADI 2415/SP, rel.
Min. Ayres Britto, 22.9.2011. (ADI-2415)
Serviços notariais e de registros: reorganização e
reconhecimento de vício - 2
O relator observou que, até pouco tempo, votava no sentido de que as atividades mencionadas incluir-se-iam na esfera dos serviços auxiliares do Poder Judiciário, e não propriamente como matéria de organização judiciária. Na seqüência, sublinhou notar, nos diplomas atacados, além da eficiência, o respeito ao princípio da moralidade administrativa pela rigorosa observância da regra do concurso público. Desse modo, por coerência e tendo em conta a necessidade de se buscar conceitos operacionais, entendeu que esse caso seria de reconhecimento de constitucionalidade incompleta ou imperfeita. Ante a ausência de declaração de inconstitucionalidade, aquiesceu não se cuidar de hipótese de utilização da técnica da modulação, que exigiria maioria qualificada. Frisou que, doravante, qualquer mudança dependeria de lei e que as novas investiduras, mediante delegação, decorrentes do último concurso realizado, seriam válidas. Ressaltou que isso, no entanto, não implicaria a validação de investiduras processadas sem concurso público. Ademais, dentro da lógica do possível, reputou que os provimentos conteriam vício a ser corrigido. O Min. Celso de Mello advertiu que, se outro provimento viesse a ser emanado por qualquer tribunal de justiça do país, seria declarado absolutamente inconstitucional, porquanto reafirmado, na ocasião, o entendimento da Corte segundo o qual a regulação normativa da matéria adversada está sujeita ao postulado da reserva constitucional de lei em sentido formal, de iniciativa exclusiva do tribunal de justiça. ADI 2415/SP, rel. Min. Ayres Britto, 22.9.2011. (ADI-2415)
Serviços notariais e de registros: reorganização e
reconhecimento de vício - 3
O Min. Gilmar Mendes destacou
que o tema relativo aos serviços notariais e de registros, do ponto de vista
histórico, sociológico, político, seria um dos mais sensíveis da República. Por
sua vez, o Min. Celso de Mello, dentre outras considerações, acresceu que se
trataria de estágio intermediário e transitório entre a situação de plena
constitucionalidade e a de absoluta inconstitucionalidade, expondo-se a
resolução estatal a um processo de progressiva inconstitucionalização, o que
permitiria vislumbrar, nos atos impugnados, normas ainda constitucionais. A
Min. Cármen Lúcia explicitou que o reconhecimento do vício, que seria
eliminado, dali por diante, por lei, não seria declaração de
inconstitucionalidade. O Min. Luiz Fux acrescentou que a orientação anterior do
Supremo chancelaria as delegações por atos interna corporis. O Min.
Cezar Peluso, Presidente, consignou que, a despeito da incompatibilidade
teórica com as normas constitucionais que ditaram, sobretudo os julgamentos da
ADI 4140/GO (DJe de 20.9.2011) e da ADI
4453 MC/PE (DJe de 24.8.2011), os efeitos ficariam preservados até o
encerramento total do 7º concurso, que estaria praticamente esgotado na sua
eficácia prática. Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava o pleito procedente
ao fundamento de que a questão exigiria ato normativo em sentido formal e
material, emanado da Assembléia Legislativa e não da direção ou mesmo do órgão
especial do tribunal. Além disso, aduzia que, ao relativizar a decisão do
Supremo — a pretexto de situações constituídas, mas não aperfeiçoadas conforme
o modelo constitucional — estimular-se-iam aqueles que apostassem na passagem
do tempo, no fato consumado, que, por vezes, passaria a ter força superior à
própria Constituição.
ADI 2415/SP, rel. Min. Ayres Britto, 22.9.2011. (ADI-2415)
Associação de moradores e cobrança de mensalidade a não-associados
A 1ª Turma proveu recurso extraordinário para reformar acórdão que determinara ao recorrente satisfazer compulsoriamente mensalidade à associação de moradores a qual não vinculado. Ressaltou-se não se tratar de condomínio em edificações ou incorporações imobiliárias regido pela Lei 4.591/64. Consignou-se que, conforme dispõe a Constituição, ninguém estaria compelido a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei e, embora o preceito se referisse a obrigação de fazer, a concretude que lhe seria própria apanharia, também, obrigação de dar. Esta, ou bem se submeteria à manifestação de vontade, ou à previsão em lei. Asseverou-se que o aresto recorrido teria esvaziado a regra do inciso XX do art. 5º da CF, a qual revelaria que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado. Aduziu-se que essa garantia constitucional alcançaria não só a associação sob o ângulo formal, como também tudo que resultasse desse fenômeno e, iniludivelmente, a satisfação de mensalidades ou de outra parcela, seja qual for a periodicidade, à associação pressuporia a vontade livre e espontânea do cidadão em associar-se. RE 432106/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 20.9.2011. (RE-432106)
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