O Plenário, por maioria, rejeitou denúncia ajuizada contra
atual deputado federal, então prefeito à época dos fatos, além de outros
acusados pela suposta prática, em concurso, do crime previsto no art. 89 da Lei
8.666/93 (“Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em
lei, ou deixar de observar as forma lidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”). Constava da inicial
acusatória que o parlamentar, o diretor e o secretário municipal de esportes e
lazer teriam contratado bandas de música para as comemorações de carnaval na
localidade, supostamente em desacordo com as hipóteses legais e sem o necessário
procedimento administrativo disposto no art. 26 da mencionada lei. A acusação
afirma va, também, que os grupos
musicais foram contratados por empresas sem vínculo com o setor artístico; que
a substituição de 2 bandas, após parecer da procuradoria local pela
inexigibilidade da licitação, teria gerado um acréscimo de R$ 7 mil ao valor
das contratações, a totalizar R$ 62 mil; e que existiriam processos de
contratação identicamente numerados com a mesma data e com o mesmo objeto. No
caso, a exordial fora aditada para consignar que o parlamentar, ao ratificar as
conclusões da procuradoria do município sem observar as forma lidades legais, teria se omitido no seu dever de
agir.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o
acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)
Inexigibilidade de licitação e
ausência de dolo - 2
Prevaleceu o voto do Min. Luiz Fux, que assentou a falta de
justa causa para o recebimento da denúncia, ante a ausência de elemento
subjetivo do tipo. Destacou, de início, ser inverídica a assertiva de que o
recebimento da peça acusatória, tendo em conta a prevalência da presunção de
inocência, possibilitaria ao acusado melhores condições de comprovar a ausência
de ilicitude. Em seguida, registrou que os delitos da Lei de Licitações não
seriam crimes de mera conduta ou forma is,
mas sim de resultado, o qual ficaria afastado, na espécie, porque as bandas,
efetivamente, prestaram serviço. Ao analisar o dolo, asseverou que a consulta
sobre a possibilidade de fazer algo demonstraria a inexistência de vontade de
praticar ilícito, de modo que aquele que consulta e recebe uma resposta de um
órgão jurídico no sentido de que a licitação seria inexigível não teria
manifestação voltada à prática de infração penal. Assinalou, ademais, que, na
área musical e artística, as obrigações seriam firma das
em razão das qualidades pessoais do contratado, fundamento este para a
inexigibilidade de licitação. O Min. Dias Toffoli frisou que a denúncia não
descrevera em que consistiria a vantagem obtida com a não-realização do
certame. Por sua vez, o Min. Gilmar Mendes apontou que, se não se tratar de
intérpretes consagrados, a norma do
art. 25, III, da Lei 8.666/93 sofreria uma relativização, uma localização. Por
fim, os Ministros Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, não vislumbraram a
existência de fato típico. Aquele Ministro acrescentou que o mencionado aditamento
não definira em que consistiria a relevância causal da omissão imputada ao
parlamentar.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o
acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)
Inexigibilidade de licitação e
ausência de dolo - 3
Vencidos os Ministros Ayres Britto,
relator, que recebia a denúncia em sua integralidade, e Marco Aurélio, que a
acolhia apenas contra o então prefeito e determinava a remessa de cópias ao
juízo de primeiro grau relativamente aos acusados que não possuíam prerrogativa
de foro no STF. Aduzia, ainda, que não se teria contratado escolhendo banda
única pelo valor artístico — quando presente a exclusividade para prestar os
serviços —, porém 8 bandas mediante empresas intermediárias. O relator, ao seu
turno, reputava que a peça acusatória atenderia as exigências legais e que
presente conjunto probatório sinalizador da prática de condutas comissivas e
omissivas para burlar a necessidade de licitação. Além disso, apontava que a
exordial permitiria aos acusados o conhecimento dos fatos a eles atribuídos,
com o exercício da ampla defesa.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o
acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)
Inquérito: gravação ambiental e
ilicitude da prova - 5
O Plenário concluiu questões de ordem suscitadas em inquérito
no qual se imputa a senador e a prefeito a suposta prática de desvio de verbas
federais (DL 201/67, art. 1º, I) — v. Informa tivos
395, 422 e 624. Inicialmente, rejeitou-se, por maioria, a questão de ordem
proposta pelo Min. Gilmar Mendes no sentido de que, antes de se examinar a
licitude da prova, fosse assentada a incompetência do Supremo, por ausência de
justa causa para investigar o detentor de foro por prerrogativa de função.
Deliberou-se pelo prosseguimento do inquérito, sob a fiscalização da Corte,
porquanto se estaria em fase embrionária, na qual apenas cabível a indagação
sobre a existência, ou não, de indícios quanto ao possível envolvimento do
parlamentar, presentes na espécie. O Min. Marco Aurélio salientou as
referências feitas ao senador pelo subscritor da “carta/denúncia”,
posteriormente reafirma das em depoimento
prestado na polícia federal, sobre eventual percentual de comissão destinado ao
parlamentar. Vencidos o suscitante e os Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e
Celso de Mello. Em seguida, também por votação majoritária, resolveu-se a
questão de ordem outrora levantada pelo Min. Marco Aurélio para se admitir o
processamento do inquérito. Reputou-se inocorrente a ilicitude apontada, e,
ainda que houvesse, ela não teria o condão de contaminar as provas
subseqüentes. O Min. Celso de Mello acrescentou que, no caso, a investigação
penal poderia ter por base elementos de informa ção
obtidos a partir de captação ambiental — ainda que à revelia de qualquer dos
sujeitos que participaram da relação dialógica — e de delação não-anônima
(“carta/denúncia”). Vencidos o suscitante e o Min. Gilmar Mendes, que, ante
origem ilícita da prova, determinavam o trancamento do feito.
Inq 2116 QO/RR, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o
acórdão Min. Ayres Britto, 15.9.2011. (Inq-2116)
Furto em estabelecimento militar e
princípio da insignificância
A 1ª Turma concedeu habeas
corpus para aplicar o princípio da insignificância em favor de militar
denunciado pela suposta prática do crime de peculato-furto. Na espécie, foram
apreendidos gêneros alimentícios na posse do paciente, avaliados em R$ 215,22,
pertencentes à organização militar em que trabalhava como cozinheiro.
Consignou-se que a jurisprudência do STF, mesmo no caso de delito militar,
admite a aplicação do aludido postulado desde que, presentes os pressupostos
gerais, não haja comprometimento da hierarquia e da disciplina exigidas dos integrantes
das forças públicas. Ressaltou-se, por fim, que na situação dos autos, não
houvera lesividade ao patrimônio, pois os bens perma neceram
no local. No tocante à hierarquia e à disciplina, assinalou-se que estas não foram
comprometidas, uma vez que ocorrera o desligamento do denunciado das Forças Arma das.
HC
107638/PE, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.9.2011. (HC-107638)
Interceptação telefônica e autoridade competente
A 1ª Turma iniciou
julgamento de agravo regimental interposto de decisão do Min. Dias Toffoli que,
em recurso extraordinário do qual relator, negara seguimento a pleito recursal,
com base nos Enunciados 279, 280, 282 e 356 da Súmula desta Corte. Alegava-se a
incompetência do juízo de 1ª instância que, na fase investigatória, autorizara
a quebra do sigilo telefônico do agravante, vereador à época dos fatos. Ocorre
que a Constituição do Estado do Rio de Janeiro estabelece a competência do
tribunal de justiça para processar e julgar ação contra aquele agente político.
Interposto recurso à Corte local, esta declarara a incompetência do juízo
singular e, não obstante, legitimara as provas produzidas na fase
investigatória, o que fora mantido pelo STJ. Na assentada, o relator manteve a
decisão agravada. Todavia, de ofício, concedeu a ordem de habeas corpus para
determinar o desentranhamento das transcrições e das provas decorrentes da
interceptação telefônica (CP, art. 157), sem prejuízo dos demais elementos
constantes do inquérito policial que, autonomamente, possam embasar a denúncia
do parquet estadual. Aduziu que a prova coligida seria nula, porquanto
autorizada por magistrado sabidamente incompetente. Após, pediu vista o Min.
Luiz Fux.
RE 632343 AgR/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 13.9.2011. (RE-632343)
Residência
do réu e direito de recorrer em liberdade
O fato de o réu não residir no distrito da culpa não constitui,
por si só, motivo bastante para justificar a denegação do direito de recorrer em liberdade. Com base
nesse entendimento, a 2ª Turma
proveu recurso ordinário em habeas corpus para garantir aos recorrentes,
se por outro motivo não estiverem presos, o direito de perma necerem
em liberdade, até o eventual trânsito em julgado da sentença condenatória. No
caso, os pacientes foram condenados a 3 anos de reclusão pelo crime de
estelionato, sem direito de recorrer em liberdade, sob o fundamento de
preservação da ordem pública e da fiel execução da lei penal, especialmente,
pelo fato de terem perma necido
presos durante a instrução criminal e do receio de que pudessem evadir-se por
não possuírem residência na comarca. Consignou-se que constituiria
discriminação de ordem regional, vedada pelo art. 3º, IV, da CF, considerar o
fato de a residência do réu não estar localizada no distrito da culpa.
Ressaltou-se não haver motivo idôneo para a manutenção da custódia cautelar. O
Min. Ricardo Lewandowski acrescentou que os recorrentes já teriam direito à progressão
para o regime aberto, uma vez que condenados à pena de 3 anos de reclusão no semi-aberto.
RHC 108588/DF,
rel. Min. Celso de Mello, 13.9.2011. (RHC-108588)
“Habeas corpus” e direito de detento
a visitas - 1
É cabível habeas corpus
para apreciar toda e qualquer medida que possa, em tese, acarretar
constrangimento à liberdade de locomoção ou, ainda, agravar as restrições a
esse direito. Esse o entendimento da 2ª Turma
ao deferir habeas corpus para assegurar a detento em estabelecimento
prisional o direito de receber visitas de seus filhos e enteados. Na espécie, o
juízo das execuções criminais decidira que o condenado não teria jus à
visitação, visto que a prisão seria local impróprio aos infantes, o que poderia
trazer-lhes prejuízos na forma ção
psíquica. A defesa, então, impetrara habeas corpus no STJ, que o
indeferira liminarmente, ao fundamento de que a pretensão não se
compatibilizava com a modalidade eleita, uma vez que não ofendido o direito de
locomoção do ora paciente. De início, rememorou-se que a jurisprudência
hodierna da Corte estabelece sérias ressalvas ao cabimento do writ, no
sentido de que supõe violação, de forma
mais direta, ao menos em exame superficial, à liberdade de ir e vir dos
cidadãos. Afirmou-se que essa orientação, entretanto, não inviabilizaria, por
completo, o processo de ampliação progressiva que essa garantia pudesse vir a
desempenhar no sistema jurídico brasileiro, sobretudo para conferir força norma tiva mais rob usta
à Constituição. A respeito, ponderou-se que o Supremo tem alargado o campo de
abrangência dessa ação constitucional, como no caso de impetrações contra
instauração de inquérito criminal para tomada de depoimento, indiciamento de
determinada pessoa, recebimento de denúncia, sentença de pronúncia no âmbito do
processo do Júri e decisão condenatória, dentre outras. Enfatizou-se que a
Constituição teria o princípio da humanidade como norte e asseguraria aos
presidiários o respeito à integridade física e moral (CF, art. 5º: “XLIX
- é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” e
Pacto de São José da Costa Rica: “Art. 5º Direito à Integridade Social 1.
Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e
moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis,
desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com
respeito devido à dignidade inerente ao ser humano”). Preconizou-se, por
conseguinte, que não se poderia tratar a pena com objetivo de retaliação, mas
de ressocialização.
HC 107701/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.9.2011.
(HC-107701)
“Habeas corpus” e direito de detento
a visitas - 2
Aludiu-se que a visitação seria
desdobramento do direito de ir e vir, na medida em que seu empece agravaria a
situação do apenado. Isso porque só haveria direito de visitas porque a
liberdade do paciente estava tolhida. Ponderou-se que, segundo a própria
teleologia da segregação criminal, eventuais erros estatais ao promovê-la
poderiam e deveriam ser sanados pela via do habeas corpus, sob
pena de não se alcançar a harmônica reintegração à comunidade daqueles que
sofrem a ação do magistério punitivo do Estado. Nesse contexto, salientaram-se
como escopos para o tratamento dos condenados, enquanto perdurar a sanção: a)
inspirar-lhes a vontade de viver conforme a lei; b) incutir-lhes o respeito por
si mesmos; e c) desenvolver-lhes o senso de responsabilidade (Regras Mínimas
para o Tratamento de Prisioneiros da Organização das Nações Unidas, nº 65).
Igualmente, destacou-se que seria direito do custodiado receber visitas do cônjuge,
da companheira, de parentes e de amigos (LEP: “Art. 41 - Constituem direitos
do preso: ... X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em
dias determinados” e Resolução nº 14 do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária: “Art. 33. O preso estará autorizado a comunicar-se
periodicamente, sob vigilância, com sua família, parentes, amigos ou
instituições idôneas, por correspondência ou por meio de visitas”). Logo,
consignou-se que não caberia negativa desse direito nem mesmo aos enteados,
porquanto, a despeito de não terem comprovado seu vínculo com o paciente,
tampouco a estabilidade da relação com a genitora, inserir-se-iam naquela
última categoria. Sublinhou-se que poderia haver denegação motivada de visita
pelo diretor do estabelecimento, o que não ocorrera no caso (LEP, art. 41,
parágrafo único: “Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser
suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento”).
Ademais, explicitou-se que o notório desajuste do sistema carcerário nacional
não poderia justificar o óbice à visita de menores. Esclareceu-se, pois, que
caberia ao Poder Público o dever de propiciar meios para que o apenado pudesse
receber, inclusive, seus filhos e enteados, em ambiente minimamente aceitável e
preparado, de modo a não colocar em risco a integridade física e psíquica dos
visitantes. Assim, concluiu-se que o habeas corpus seria o meio apto a
tutelar todo o plexo de relações ligadas à execução penal, até porque outro
instrumento não seria identicamente expedito.
HC 107701/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.9.2011.
(HC-107701)
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