O Plenário iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado
pela Associação Paulista de Magistrados – APAMAGIS contra ato do Conselho
Nacional de Justiça – CNJ que determinara fosse suspensa a conversão em pecúnia
de férias vencidas cumuladas dos magistrados estaduais por necessidade de serviço.
O ato impugnado fora proferido em sede de pedido de providências originado de
consulta formulada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios -
TJDFT, com a finalidade de saber a viabilidade de continuar indenizando as
férias vencidas dos juízes, tendo em conta a revogação da Resolução 25/2006/CNJ
— que dispõe sobre a conversão em pecúnia de férias de magistrados não gozadas
por necessidade de serviço — pela Resolução 27/2006/CNJ. A impetrante questiona
entendimento segundo o qual a conversão de férias em pecúnia deveria ser reservada
à situação excepcional única de impossibilidade absoluta de gozo do direito,
assim caracterizada quando o magistrado deixar de pertencer aos quadros da
magistratura em
atividade. Alega a entidade de classe: a) negativa de arquivamento
do processo, apesar da desistência do TJDFT; b) aplicação de efeitos amplos ao
que decidido sem a participação dos demais interessados na discussão da
matéria; c) impossibilidade de julgamento em virtude da ausência, na sessão, da
relatora do processo; d) ofensa à coisa julgada, porquanto o tema já teria sido
objeto de pronunciamentos anteriores no âmbito do Poder Judiciário; e) falta do
quórum exigido para a atribuição de efeitos normativos à decisão do CNJ e f)
transgressão a direito líquido e certo dos substituídos.
Inicialmente, rejeitaram-se as preliminares suscitadas.
Relativamente à primeira, aduziu-se que o CNJ indeferira o pedido de
desistência da consulta formulado pela presidência do TJDFT, porquanto
apresentado quando já iniciada a apreciação da consulta e porque não envolvido
interesse pessoal do consulente, o qual personificaria o próprio tribunal.
Quanto à falta de participação de interessados, registrou-se inexistir a glosa
de uma situação concreta, sendo a questão analisada pelo CNJ — que poderia
fazê-lo de ofício no campo do controle administrativo do Judiciário — sob o
ângulo de princípios próprios à Administração Pública. Repeliu-se, de igual
modo, a assertiva de impossibilidade de conclusão do feito sem a presença da
relatora, uma vez que, durante o julgamento do processo, houvera a modificação
na composição do CNJ, inclusive com a substituição do relator originário, que
votara na matéria. No tocante ao argumento de que o CNJ se manifestara, não
obstante a existência de pronunciamentos judiciais preclusos, reiterou-se que a
atuação de tal órgão não ocorrera frente a um caso concreto, formalizado com
balizas subjetivas. Ademais, salientou-se que o CNJ emitira orientação aos
tribunais sem haver adentrado campo que porventura tivesse sido objeto de
decisão judicial. Consignou-se, ainda, que essa causa de pedir referente à
judicialização do tema — ventilada por um dos conselheiros — teria sido
suplantada por aquele colegiado, ao julgar a matéria de fundo. Com relação à
última preliminar, destacou-se que o CNJ, como todo e qualquer órgão
administrativo, atuaria submetido ao princípio da legalidade e não possuiria poder
normativo. Além disso, afirmou-se que a Constituição não trataria do quórum
para a deliberação no que concerne ao controle da atuação administrativa e
financeira do Poder Judiciário. Ressaltou-se, ainda, que, presentes 13 conselheiros
e já computado o voto proferido pelo relator originário, houvera o consenso de
9 conselheiros, o que perfaria a maioria absoluta.
No mérito, o Min. Marco Aurélio, relator, concedeu parcialmente
o writ. Assegurou aos associados da impetrante: a) o gozo das férias, uma
vez completado o período aquisitivo; ou b) na impossibilidade de se atender ao
direito constitucional acima, por imperiosa necessidade do serviço certificada
ante o requerimento do magistrado, a indenização simples de período de férias
que ultrapasse os 60 dias, a ser satisfeita, mediante opção do interessado, conforme
a disponibilidade orçamentária. Realçou a envergadura desse direito inerente à
dignidade do homem, bem como o fato de não haver dúvidas de que as férias
gerariam, de início, uma obrigação de fazer, com o objetivo de preservar a
saúde do prestador dos serviços. Mencionou previsão contida na Lei de Organização
da Magistratura Nacional relativamente a férias anuais de 60 dias para os
juízes (LC 35/79, art. 66), sendo vedado o seu fracionamento em períodos
inferiores a 30 dias. Salientou que referido dispositivo levaria em conta o
célere ritmo dos trabalhos desenvolvidos, o dispêndio de energia física e
mental e a necessidade de o juiz reciclar-se tanto no que respeita à vida
social quanto à formação técnica e humanística. Frisou que as férias somente
poderiam ser acumuladas por imperiosa necessidade do serviço e pelo máximo de 2
meses. Assinalou, ademais, haver nesse diploma legal preocupação com a
continuidade dos serviços, sem, contudo, afastar-se a proibição de serem
acumuladas férias acima de 2 períodos de 30 dias.
O relator, a partir de dados estatísticos levantados pelo CNJ,
expôs que a situação do Judiciário paulista seria notoriamente deficitária, a
conduzir a quadro revelador de imenso e desumano esforço, obrigatório,
inafastável, de seus juízes. Ponderou que maior carga de trabalho da magistratura
nacional recairia sobre os juízes paulistas e que, diante desse contexto,
surgiria círculo vicioso no que existentes magistrados, com mais de 2 períodos
de 30 dias acumulados, impossibilitados de tirar férias em face do interesse da
Administração. Asseverou, dessa forma, ser necessária a compatibilização das
seguintes premissas: a) o gozo das férias; b) a continuidade na prestação da jurisdição,
retratada na relevância e urgência dos serviços; e c) a mitigação dos efeitos
de indeferimento de pleitos sucessivos de magistrados, diante da imperiosa
necessidade de serviço. Concluiu que a obrigação de fazer deveria transmudar-se
em obrigação de dar, haja vista não ser possível entender-se que o magistrado
poderia, a um só tempo, ficar sem o gozo das férias e acumular inúmeros
períodos sem que compensação alguma ocorresse. Os Ministros Dias Toffoli,
Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski acompanharam o relator. Em divergência, o
Min. Ayres Britto denegou a ordem. Levou em conta que o ato impugnado não teria
sido propriamente uma decisão do CNJ, mas uma consulta — a qual possuiria
caráter de orientação geral ou de diretriz — respondida em conformidade com
orientação do STF, no sentido de que as férias não se destinariam à conversão
em pecúnia e sim, ao seu gozo in natura. Após, pediu vista o Min.
Gilmar Mendes.
MS 28286/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 15.12.2010. (MS
28286)
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