“Prefeito itinerante” e segurança jurídica
O Plenário, após reconhecer a existência de repercussão geral da
matéria, deu provimento, por maioria, a recurso extraordinário, para
julgar inaplicável a alteração da jurisprudência do TSE quanto à
interpretação do art. 14, § 5º, da CF, com a redação dada pela EC 16/97,
às eleições de 2008 (“O Presidente da República, os Governadores de
Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou
substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único
período subseqüente”). Na espécie, o recorrente, após exercer 2 mandatos
consecutivos como prefeito do mesmo município, transferira seu
domicílio eleitoral e, ao atender às regras de desincompatibilização,
candidatara-se ao cargo de prefeito de municipalidade diversa no pleito
de 2008. À época, a jurisprudência do TSE seria firme no sentido de que
não se cogitaria de falta de condição de elegibilidade nessa hipótese,
pois a candidatura dera-se em localidade diversa. Por essa razão, sua
candidatura não teria sido impugnada pelo Ministério Público ou por
partido político. Após transcorrido todo o período de campanha,
pressuposta a regularidade da candidatura, conforme as normas então
vigentes, o recorrente teria logrado vitória no pleito eleitoral.
Contudo, no período de diplomação dos eleitos, o TSE modificara
radicalmente sua jurisprudência e passara a considerar a hipótese como
vedada pelo art. 14, § 5º, da CF. Em consequência, o Ministério Público
Eleitoral e a coligação adversária impugnaram o diploma do candidato
(Código Eleitoral, art. 262, I), a resultar na sua cassação.
Prevaleceu o voto do Min. Gilmar Mendes, relator. Explicou que o recurso
em comento cuidaria de 2 questões constitucionais distintas, não
obstante inter-relacionadas no caso concreto. A primeira diria respeito à
controvérsia quanto à interpretação da regra que permitiria única
reeleição subsequente dos ocupantes de cargos de Chefe do Poder
Executivo — na hipótese, os prefeitos — ou de quem os houvesse sucedido
ou substituído no curso do mandato. Debater-se-ia, por um lado, se esse
preceito constitucional: a) possibilitaria candidatura ao cargo em
questão por cidadão que ocupara, por 2 mandatos consecutivos, reeleito
uma vez, posição de idêntica natureza em município distinto; ou b)
evidenciaria vedação absoluta à segunda reeleição para ocupação da mesma
natureza, ainda que o novo sufrágio ocorresse mediante prévia alteração
do domicílio eleitoral em ente da federação diverso daquele em que
exercido o cargo em referência. A segunda residiria na importante
relação entre mudança jurisprudencial e segurança jurídica, a qual
perscrutaria os problemas da retroação e da aplicabilidade imediata dos
efeitos das decisões que implicassem modificação do entendimento do
órgão de cúpula da Justiça Eleitoral. Indagar-se-ia se o postulado da
segurança jurídica, também em sua face de princípio da confiança,
poderia constituir barreira normativa contra a retroatividade e a
aplicabilidade imediata dessas decisões que resultassem câmbio
jurisprudencial em matéria eleitoral, sobretudo no curso do período de
eleição.
Rememorou que estaria pendente de julgamento pela Corte o mérito da ADI
1805/DF, cujo objeto teria identidade com o do extraordinário em tela.
Aduziu que, desde o indeferimento da medida cautelar dessa ação direta,
transcorreram 14 anos com plena vigência do art. 14, § 5, da CF.
Salientou que a apreciação da ação direta não seria óbice ao
conhecimento do extraordinário em exame, pois se analisaria neste o
texto constitucional em sua aplicação concreta, pressuposta a plena
vigência normativa dele. Nesse aspecto, lembrou que foram realizadas 4
eleições gerais e 3 municipais sob a égide da norma introduzida pela EC
16/97, de modo que pareceria impensável que decisão desta Corte
interferisse nesse estado já conformado e consolidado. Portanto, as
eleições municipais de 2008 requereriam interpretação adequada do art.
14, § 5º, da CF, independentemente do julgamento do mérito da ADI
1805/DF. Prelecionou que, com a nova redação atribuída pela EC 16/97, a
regra em discussão passaria a deter natureza de norma de elegibilidade
(ou de elegibilidade restrita) e que, ao criar o instituto da reeleição,
permitiria apenas único novo sufrágio para o cargo de Chefe do Poder
Executivo de igual natureza. Asseverou que esse dispositivo teria
contemplado não somente o postulado da continuidade administrativa, mas
também o princípio republicano, que impediria a perpetuação de
determinada pessoa ou grupo no poder. Outrossim, ponderou que a clareza
do preceito quanto à unicidade da reeleição não afastaria diversas
questões relativas à sua interpretação e incidência aos variados casos
concretos.
Aludiu que, antes do advento do instituto da reeleição, a matéria já se
colocaria ante a regra da inelegibilidade absoluta (irreelegibilidade)
de quem já teria exercido cargos de Chefe do Poder Executivo. No ponto,
mencionou jurisprudência da Corte, segundo a qual a irreelegibilidade
prevista no art. 151, § 1º, a, da Constituição de 1967/69
compreender-se-ia como proibitiva da reeleição para o mesmo cargo.
Historiou que o TSE teria mantido por muitos anos entendimento pacífico
no sentido de que o instituto da reeleição diria respeito à candidatura
ao mesmo cargo e no mesmo território, de sorte que não haveria vedação a
que o prefeito reeleito em determinado município candidatasse-se a
cargo de idêntica natureza em outra municipalidade, vizinha ou não, em
período subsequente, desde que transferisse regularmente seu domicílio
eleitoral e se afastasse do cargo 6 meses antes do pleito. Apontou que a
exceção a essa regra ocorreria apenas nas hipóteses de município
desmembrado, incorporado ou que resultasse de fusão em relação à
municipalidade anterior. Observou que, todavia, em 17.12.2008, o TSE
teria alterado sua antiga jurisprudência, ao consignar que a mudança de
domicílio eleitoral para município diverso, por quem já exercera 2
mandatos consecutivos como prefeito de outra localidade, configuraria
fraude à regra constitucional que proibiria segunda reeleição (CF, art.
14, § 5º). Essa prática, ato aparentemente lícito, consubstanciaria
desvio de finalidade, visando à monopolização do poder local. Nessa
senda, avaliou que o argumento baseado nas noções de fraude à regra
constitucional do art. 14, § 5º, abuso do direito de transferir o
domicílio eleitoral, desvio da finalidade do direito à fixação do
domicílio eleitoral seria plenamente válido quando utilizado em
situações cujas circunstâncias fáticas detivessem as seguintes
características: a) os municípios possuíssem territórios limítrofes ou
muito próximos, a pressupor existência de única microrregião eleitoral,
formada por eleitorado com características comuns e igualmente
influenciado pelos mesmos grupos políticos atuantes nessa região; e b)
as municipalidades tivessem origem comum, resultante de desmembramento,
incorporação ou fusão (CF, art. 18, § 4º).
Articulou que, nessas hipóteses, criar-se-ia presunção jurídica (juris
tantum) no sentido de que a transferência do domicílio eleitoral de
município para outro visaria alcançar finalidade incompatível com o art.
14, § 5º, da CF, isto é, a perpetuação de certa pessoa no poder local.
Não obstante, registrou que o argumento não seria generalizável, pois
inválido para outras várias situações, como aquelas em que os
municípios: a) pertencessem ao mesmo estado-membro, mas fossem
territorialmente distantes o bastante para se pressupor que possuiriam
bases eleitorais e grupos políticos completamente distintos; e b)
estivessem situados em diferentes estados-membros e territorialmente
distantes. Sublinhou que essas circunstâncias seriam plenamente
possíveis em razão do conceito amplo de domicílio eleitoral adotado pela
justiça especializada, que permitiria que o cidadão pudesse
legitimamente manter, ao longo de sua vida política, diferentes
domicílios conforme mantivesse vínculos econômicos ou afetivos em
diversas localidades. Realçou que estas situações não seriam fruto de
qualquer estratégia política de grupos ou partidos, mas simples
resultado da contingência da vida privada individual. Entretanto,
atentou para o fato de que se deveriam tomar como parâmetro hipóteses de
transferência e de reeleição entre quaisquer municípios, tendo em conta
que a questão constitucional abarcaria gama mais variada de fatos que
não se circunscreveriam ao sucessivo sufrágio em municipalidades
vizinhas. Destarte, considerou que a solução para a temática
basear-se-ia na interpretação do art. 14, § 5º, da CF, a conter o
significado do instituto da reeleição.
Explanou que houvera mudança substancial a partir da alteração do art.
14, § 5º, da CF, dado que, na sua redação original, perfaria causa de
inelegibilidade absoluta e assumiria caráter proibitivo, na medida em
que vedaria a reeleição para os mesmos cargos, no período subsequente,
dos ocupantes das funções de Chefe do Poder Executivo. Com a EC 16/97, o
dispositivo teria a natureza de condição de elegibilidade e caráter de
permissão, ainda que possibilitasse a reeleição por apenas 1 vez. Logo,
deduziu que a nova condição de elegibilidade fundamentar-se-ia no
postulado da continuidade administrativa, que condicionaria sua
aplicação teleológica e constituiria o substrato do art. 14, § 5º, da
CF. Além disso, preceituou que o princípio republicano também seria base
do instituto da reeleição, a impedir a perpetuação de pessoa ou grupo
no poder. Reputou sensato entender que esse princípio obstaria a
terceira eleição não apenas no mesmo município, mas em relação a
qualquer outra municipalidade da federação. Se assim não fosse,
tornar-se-ia possível a figura do denominado “prefeito itinerante” ou
“prefeito profissional”, claramente incompatível com esse princípio
republicano, que também traduziria postulado de
temporariedade/alternância do exercício do poder. Inferiu que a
reeleição, como condição de elegibilidade, somente estaria presente nas
hipóteses em que esses princípios fossem igualmente contemplados e
concretizados. Nestes termos, placitou interpretação de que somente
seria possível eleger-se para o cargo de prefeito municipal por 2 vezes
consecutivas. Após isso, só se permitiria, respeitado o prazo de
desincompatibilização de 6 meses, a candidatura a outro cargo, ou seja, a
mandato legislativo, ou aos cargos de governador de estado ou de
Presidente da República.
Destacou que seria crucial avaliar se o TSE, ao mudar sua
jurisprudência, respeitara o princípio da segurança jurídica. Isso
porque o caso em comento seria peculiar. Ressaiu que, em situações nas
quais alterada a concepção longamente adotada, seria sensato modular os
efeitos da decisão, em face da segurança jurídica. Enumerou exemplos em
que o Tribunal teria ressalvado atos praticados e decisões já proferidas
anteriormente à mudança de orientação (Inq 687/SP, DJU de 9.11.2001; CC
7204/MG, DJU de 9.12.2005; HC 82959/SP, DJU de 1º.9.2006). No ponto,
realçou que não se trataria de aplicação do art. 27 da Lei 9.868/99, mas
de substancial alteração de jurisprudência, decorrente de nova
interpretação constitucional, o que permitiria ao Supremo, tendo em
vista razões de segurança jurídica, atribuir efeitos prospectivos às
suas decisões. Enfatizou que também o TSE, quando modificasse sua
jurisprudência, especialmente no decorrer do período eleitoral, deveria
realizar a modulação dos efeitos de seus julgados, em razão da
necessária preservação da segurança jurídica, que lastrearia a
realização das eleições, especialmente a confiança dos cidadãos
candidatos e eleitores.
Mencionou que os temas da evolução jurisprudencial e da possível mutação
constitucional seriam muito ricos e repercutiriam no plano material,
bem como no processual e, precipuamente, no campo do processo
constitucional. Quanto a eles, aclarou que interpretar ato normativo
nada mais seria do que colocá-lo no tempo ou integrá-lo na realidade
pública. Encampou doutrina segundo a qual, conforme a alteração da
situação normativa, existiriam fatos que poderiam provocar mudança de
interpretação, tais como modificações na estrutura da ordem jurídica
global, nítida tendência da legislação mais recente, novo entendimento
da ratio legis ou dos critérios teleológico-objetivos, bem assim
necessidade de adequação do direito pré-constitucional aos princípios
constitucionais. Consoante esta teoria, os tribunais poderiam abandonar
sua orientação anterior porque teriam se convencido de que seria
incorreta em face do fator temporal, que teria se lastreado em falsas
suposições ou em conclusões não suficientemente seguras. Trouxe à baila a
afirmação de que o preciso momento em que essa ilação deixara de ser
correta seria impossível determinar, porque as alterações subjacentes
efetuar-se-iam na maior parte das vezes de modo contínuo, e não de
repente. Dessa forma, colacionou a tese de que se deveria escolher a
interpretação, dentre aquelas possíveis, que fosse agora a única
conforme à Constituição. Expôs assunto segundo o qual se propiciaria
releitura do fenômeno da chamada mutação constitucional, ao asseverar
que as situações da vida seriam constitutivas do significado das regras
de direito, na medida em que somente no momento de sua aplicação aos
casos ocorrentes que se revelariam o sentido e o alcance dos enunciados
normativos.
Nestes termos, enfatizou que, em verdade, a norma jurídica não
consubstanciaria o pressuposto, mas o resultado do processo
interpretativo, isto é, a norma seria a sua interpretação. Nesse
diapasão, não existiria norma jurídica, senão aquela interpretada, de
sorte que interpretar ato normativo seria colocá-lo no tempo ou
integrá-lo na realidade pública. Introduziu o conceito de
pós-compreensão, que seria o conjunto de fatores temporalmente
condicionados com base nos quais se compreenderia “supervenientemente”
certa norma. Para o relator, todo esse esforço hermenêutico resultaria
na pós-compreensão, a qual seria a pré-compreensão do futuro, ou seja, o
elemento dialético correspondente da ideia de pré-compreensão. Essa
concepção permitiria atestar que toda lei interpretada — não apenas as
denominadas leis temporárias — caracterizaria dispositivo com duração
temporal limitada, de modo que a atividade hermenêutica nada mais seria
que procedimento historicamente situado. Em outras palavras, o texto,
confrontado com novas experiências, transformar-se-ia necessariamente em
outro texto, o que originaria a ideia desse contínuo interpretar: a
pré-compreensão levaria à pós-compreensão. Discorreu, pois, que a
interpretação constitucional aberta dispensaria o conceito de mutação
constitucional enquanto categoria autônoma, porquanto se estaria sempre
em mutação constitucional. Ficaria, então, evidente que o Tribunal não
poderia fingir que sempre pensara de certa forma ao modificar seu
entendimento. Expressou que, diante disto, haveria a necessidade de,
nesses casos, fazer-se o ajuste do resultado, adotando-se técnica de
decisão que, tanto quanto possível, traduzisse mudança de valoração.
Exprimiu que, no plano constitucional, essas alterações na concepção
jurídica poderiam produzir mutação normativa ou evolução na
interpretação, de modo a permitir que viesse a ser reconhecida a
inconstitucionalidade de situações anteriormente reputadas legítimas.
Anotou que a orientação doutrinária tradicional, marcada por alternativa
rigorosa entre atos legítimos, ou ilegítimos, encontraria dificuldade
para identificar a consolidação de “processo de inconstitucionalização”,
uma vez que preferiria admitir que, conquanto não identificada, a
ilegitimidade sempre existira. Certificou que, todavia, não se operaria
dessa forma, pois os diversos entendimentos de mundo conviveriam, sem
que, muitas vezes, o “novo” tivesse condições de superar o “velho”. A
respeito, evidenciou que as mudanças radicais na interpretação da
Constituição deveriam vir acompanhadas da cuidadosa reflexão sobre suas
consequências, tendo em conta o postulado da segurança jurídica.
Ressurtiu que não só o Supremo, mas também o TSE deveriam adotar essas
cautelas por ocasião das denominadas “viragens jurisprudenciais” na
interpretação dos preceitos constitucionais relacionados aos direitos
políticos e ao processo eleitoral. Versou que, em virtude do caráter
normativo dos atos judiciais emanados do TSE, os quais regeriam todo o
processo de sufrágio, modificações na sua jurisprudência teriam efeitos
normativos diretos sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões
sobre os direitos fundamentais dos cidadãos — eleitores e candidatos — e
partidos políticos. Nesse âmbito, portanto, a segurança jurídica
assumiria a sua face de princípio da confiança a fim de proteger a
estabilização das expectativas de todos aqueles que, de alguma forma,
participassem dos prélios eleitorais.
Desta feita, sobrelevou que a importância fundamental do princípio da
segurança jurídica para regular o transcurso dos processos eleitorais
plasmar-se-ia no postulado da anterioridade eleitoral, positivado no
art. 16 da CF (“A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor
na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um
ano da data de sua vigência”). Então, as decisões do TSE que implicassem
alteração de jurisprudência, no curso do pleito eleitoral ou logo após o
seu encerramento, não incidiriam de imediato no caso concreto e somente
possuiriam eficácia sobre outras situações no pleito eleitoral
posterior. Finalizou que a decisão do TSE em tela, apesar de ter
asseverado corretamente que seria inelegível para o cargo de prefeito o
cidadão que exercera por 2 mandatos consecutivos cargo de mesma natureza
em município diverso, não poderia retroagir a fim de alcançar diploma
regularmente concedido a vencedor das eleições de 2008 para prefeito de
outra municipalidade. Aquilatou que se deveria assegurar a conclusão do
mandato a ele. Por fim, assentou, sob o regime da repercussão geral,
que: a) o art. 14, § 5º, da CF, interpretar-se-ia no sentido de que a
proibição da segunda reeleição seria absoluta e tornaria inelegível para
determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já cumprira
2 mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma
natureza, ainda que em ente da federação diverso; e b) as decisões do
TSE que acarretassem mudança de jurisprudência no curso do pleito
eleitoral ou logo após o seu encerramento não se aplicariam
imediatamente ao caso concreto e somente teriam eficácia sobre outras
situações em pleito eleitoral posterior.
Vencidos, quanto à modulação, os Ministros Joaquim Barbosa, Cármen
Lúcia, Ricardo Lewandowski e Ayres Britto, Presidente, que desproviam o
recurso. O Min. Joaquim Barbosa aduzia não ser possível conceder
modulação por ter o TSE julgado procedente pedido de impugnação do
diploma do candidato, ainda no período eleitoral, antes da sua posse. A
Min. Cármen Lúcia ressaltou que o TSE, em inúmeros julgados, teria
vedado a candidatura de prefeito reeleito a outra prefeitura desde 2008.
Portanto, inexistiria afronta à segurança jurídica, pois surpresa
haveria para os prefeitos que teriam sido afastados e não tiveram
recurso submetido ao STF. O Min. Ricardo Lewandowski comungava da tese
central defendida pelo relator, no sentido da ocorrência de fraude à
Constituição, embora aparentemente houvesse licitude formal no ato de
mudança de domicílio. Afirmava que, na verdade, ter-se-ia burla à
Constituição, porque se pretenderia, mediante expedientes pretensamente
lícitos, violar o núcleo do princípio republicano, ou seja, a proibição
de reeleições sucessivas. Entendia não reconhecido direito subjetivo ao
exercício de mandato eletivo eivado por causa de inelegibilidade
constitucional, tampouco direito adquirido contra a Constituição.
Afastava a incidência do art. 16 da CF, haja vista não se tratar de
alteração de normas de natureza procedimental. Reconhecia, em que pese a
mudança de jurisprudência, que o registro de candidatura se fizera em
flagrante transgressão à causa de inelegibilidade prevista no art. 14, §
5º, da CF, que já se encontraria em vigor. O Presidente ponderava que a
técnica da aplicabilidade prospectiva das decisões judiciais operaria
no interior de uma mesma Corte. Porém, não se deveria aplicá-la em sede
de revisão.
Por sua vez, os Ministros Cezar Peluso e Marco Aurélio davam provimento
ao recurso, entretanto, em maior extensão. Consideravam que deveria ser
mantida a antiga jurisprudência do TSE, segundo a qual não haveria
impedimento a que prefeito reeleito em determinado município pudesse se
candidatar a cargo executivo em outra cidade. O Min. Cezar Peluso, ao
sopesar qual seria a ratio juris ou a ratio constitutiones do art. 14, §
5º, da CF, ressalvava haver espectro de amplas possibilidades, porém,
não existiria vedação constitucional, de caráter geral, a proibir
eleições consecutivas para vários cargos. Observava ser possível a
reeleição em relação a vários cargos da Administração, sucessiva e
indefinidamente. Não obstante, estar-se-ia a vedá-la para o de prefeito.
Aduzia que a única explicação razoável seria a inconveniência de
sucessão indefinida em cargos do Executivo, a evitar-se abuso de poder.
Consignava não haver reeleição para outro cargo e, quando a Constituição
mencionasse reeleição e mandato, pressupor-se-ia mandato relativo ao
mesmo cargo. Concluía ausente regra constitucional proibitiva da
reeleição para vários cargos. O Min. Marco Aurélio acrescia não se poder
incluir, no preceito constitucional, cláusula de inelegibilidade que
dele não constasse. Indagava, de igual forma, como conciliar a
autorização para que prefeito — o qual renunciara ao cargo, mesmo que no
segundo mandato — pudesse se candidatar a cargos de Presidente da
República, de governador, de deputados federal e estadual e de vereador,
mas que não pudesse fazê-lo no tocante à chefia de Poder Executivo em
município diverso. Destacava que as hipóteses de inelegibilidade
estariam previstas de forma exaustiva e não exemplificativa e, por isso,
vedado ao intérprete restringir o que não contemplado em preceito
constitucional. Lembrava que a interpretação sistemática dos diversos
parágrafos do art. 14 da CF seria conducente a estabelecer que, caso um
político se apresentasse para concorrer a cargo de prefeito em outro
município, não estaria impedido de fazê-lo. Por fim, afirmava que norma
geradora de inelegibilidade deveria ser expressa, aprovada pelos
integrantes do Congresso Nacional.
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