sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Ação Pouplar - Jurisprudência

Conheça a jurisprudência do STF e STJ sobre a ação popular


AÇÃO POPULAR. ENERGIA ELÉTRICA. HONORÁRIOS PERICIAIS. ISENÇÃO.


In casu, cuida-se de ação popular ajuizada na origem contra a companhia de energia elétrica e outros com o intuito de que seja declarada a ilegalidade de faturamento de contrato de fornecimento de energia elétrica destinada à iluminação pública, ou seja, iluminação de vias internas de condomínios fechados. Consta dos autos que, já na fase da sentença de mérito, entendeu-se haver necessidade de produção de prova pericial para solucionar o mérito e o tribunal a quo manteve o mesmo entendimento da sentença, condenando o autor da ação e o réu a antecipar os honorários periciais. No REsp, discute-se a determinação de antecipar os honorários periciais em ação popular, visto ser aplicável o art. 18 da Lei n. 7.347/1985 – Lei da Ação Civil Pública (até mesmo porque essa lei baseou-se na Lei n. 4.717/1965). Para o Min. Relator tem razão o recorrente (autor) ao insurgir-se contra o adiantamento dos honorários periciais diante da vedação expressa do citado artigo, que afirma não haver adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, bem como, na condenação em honorários de advogado, custas e despesas processuais, salvo quando comprovada a má-fé. Ressaltou ainda que não se pode conhecer da alegada violação do art. 5º da CF/1988 por ser inviável a análise de matéria constitucional neste Superior Tribunal, sendo aplicável, por analogia, o óbice da Súm. n. 284-STF. Com esse entendimento, a Turma conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento. Precedentes citados: AgRg no Ag 1.103.385-MG, DJe 8/5/2009, e REsp 858.498-SP, DJ 4/10/2006. REsp 1.225.103-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 21/6/2011. “>


AÇÃO POPULAR. LEGITIMIDADE. CIDADÃO. ELEITOR.


A ação popular em questão foi ajuizada por cidadão residente no município em que também é eleitor. Sucede que os fatos a serem apurados na ação aconteceram em outro município. Vem daí a discussão sobre sua legitimidade ad causam a pretexto de violação dos arts. 1º, caput e § 3º, da Lei n. 4.717/1965 e 42, parágrafo único, do Código Eleitoral. Nesse contexto, é certo que o art. 5º, LXXIII, da CF/1988 reconhece a legitimidade ativa do cidadão e não do eleitor para propor a ação popular e que os referidos dispositivos da Lei n. 4.717/1965 apenas definem ser a cidadania para esse fim provada mediante o título de eleitor. Então, a condição de eleitor é, tão somente, meio de prova da cidadania, essa sim relevante para a definição da legitimidade, mostrando-se desinfluente para tal desiderato o domicílio eleitoral do autor da ação, que condiz mesmo com a necessidade de organização e fiscalização eleitorais. Já o citado dispositivo do Código Eleitoral traz requisito de exercício da cidadania em determinada circunscrição eleitoral, o que não tem a ver com a sua prova. Dessarte, conclui-se que, se for eleitor, é cidadão para fins de ajuizamento da ação popular. REsp 1.242.800-MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 7/6/2011.


Isenção de Ônus da Sucumbência e Medida Cautelar Preparatória

O procedimento cautelar está intrinsecamente ligado ao processo principal, por isso a disciplina constitucional que se aplica às ações cautelares deve ser a mesma para eventuais medidas cautelares preparatórias que se façam necessárias, tendo em conta a natureza instrumental e acessória de tais medidas em face da ação principal. Com base nesse entendimento, a Turma proveu recurso extraordinário para isentar o recorrente do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios impostos em razão de ter restado vencido em medida cautelar por ele intentada, preparatória de futura ação popular. Na espécie, tratava-se de recurso interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que confirmara sentença a qual concluíra que a isenção constitucional do ônus da sucumbência apenas abarca a ação popular e não as medidas cautelares, ainda que preparatórias. Consignou-se que a demanda principal, entretanto, não chegara a ser ajuizada, o que seria irrelevante para fins de isenção do autor do ônus da sucumbência. Ademais, assentou-se o não cabimento de interpretação restritiva do comando do art. 5º, LXXIII, da CF (“LXXIII – qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;”).


AÇÃO POPULAR. JUNTADA. DOCUMENTO. MP.

Em ação popular que visava à anulação de contrato administrativo, o juízo singular, ao deferir a inicial, fixou prazo de 10 dias para a juntada do título eleitoral do autor. Transcorrido o prazo sem manifestação da parte, o Ministério Público (MP) formalizou pedido de traslado de cópia do referido documento, que estava anexa a outro processo, a fim de sanar a omissão apontada antes da prolação da sentença. Assim, discute-se, no REsp, entre outros temas, se houve afronta ao art. 6º, § 4º, da Lei n. 4.717/1965 e ao art. 284 do CPC ao argumento de que, em ação popular, não compete ao Parquet cumprir determinações impostas às partes, como também promover juntada de documentos fora do prazo. Entendeu o Min. Relator que, segundo a inteligência do art. 6º, § 4º, da Lei n. 4.717/1965, cabe ao MP, ao acompanhar a ação, entre outras atribuições, apressar a produção de prova. Dessa forma, o Parquet tem legitimidade para requerer e produzir as provas que entender necessárias ao deslinde da demanda, não havendo, na espécie, nenhum empecilho legal para pedir em juízo o traslado de cópia do mencionado documento essencial para a propositura da ação. Logo, o MP, ao requisitar a documentação, não atuou como autor, mas apenas cumpriu seu dever de intervir obrigatoriamente na ação popular em razão da flagrante indisponibilidade dos interesses em jogo, agilizando produção de prova essencial para o prosseguimento do feito. Ressaltou, ainda, que, com relação à alegada juntada de documento fora do prazo, este Superior Tribunal já se pronunciou no sentido de admitir a extemporânea emenda da inicial, desde que não se tenha concretizado o abandono da causa. Destacou, outrossim, o Min. Luiz Fux que, no caso, a condição de eleitor é necessária para comprovar a legitimatio ad causamativa, assim, torna-se a questão da legitimação matéria de ordem pública, portanto superável a qualquer tempo, antes da sentença final. Além disso, é também uma prejudicial em relação à questão formal da legitimidade, que implica matéria de prova, sendo assentes a doutrina e a jurisprudência no sentido de que não há preclusão pro judicato nessas hipóteses. Com essas considerações, a Turma negou provimento ao recurso especial. Precedentes citados: REsp 638.353-RS, DJ 20/9/2004, e REsp 871.661-RS, DJ 11/6/2007. REsp 826.613-SP, Rel.Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 18/5/2010.


AÇÃO POPULAR. ACORDO. MUNICÍPIO.

O município ajuizou ação ordinária contra o estado-membro e outros, por rebelar-se contra o critério de distribuição da parcela de ICMS referente a uma usina hidroelétrica. Conforme a legislação estadual, o município só fazia jus a 3% dessas receitas, mas ele buscava receber 100%. Sucede que, quanto a isso, houve acordo, homologado judicialmente, em que o município era contemplado com 50% da referida parcela. Então, cidadãos do município ajuizaram a ação popular ao fundamento de que houve renúncia de receita e consequente lesão ao patrimônio público, na qual foi concedida liminar, ao final mantida pelo acórdão recorrido. Nesse contexto, vê-se que o acordo realizado entre os municípios (tal qual termo de ajustamento de conduta) pode, em tese, ser rescindido (art. 486 do CPC), desde que ocorra ofensa ao patrimônio público lato sensu, tangível ou intangível. Assim, a rigor, o objeto da anulação é o ato jurídico subjacente (ajuste entre as partes) e não exatamente a sentença, que é meramente declaratória. Dessarte, no caso, em que o pleito é de anulação de ato lesivo, a ação popular é adequada (art. 5º, LXXIII, da CF/1988), pois essa adequação é aferida pelo pedido formulado, não pelo resultado da demanda. Anote-se que não se cuidou do mérito, visto que, ao cabo, a decisão atacada é apenas liminar. REsp 884.742-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/4/2010.


AÇÃO POPULAR. PREJUÍZO. ERÁRIO.

Trata-se de ação popular que comprovou que o prefeito construiu monumento referente ao Cristo Redentor sem previsão orçamentária nem processo licitatório e o condenou ao pagamento de perdas e danos no montante gasto. No REsp, o prefeito insurge-se contra a condenação; pois, a seu ver, não houve lesão ao patrimônio público. Para o Min. Relator, é possível afirmar a prescindibilidade do dano para a propositura da ação popular, sem adentrar o mérito da existência de prejuízo econômico ao erário. Isso porque a Lei de Ação Popular (Lei n. 4.717/1965), em seu art. 1º, § 1º, ao definir o patrimônio público como bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico, deixa claro que o termo “patrimônio público” deve ser entendido de maneira ampla, a abarcar não apenas o patrimônio econômico, mas também outros valores, entre eles, a moralidade administrativa. A Suprema Corte já se posicionou nesse sentido e, seguindo o mesmo entendimento, este Superior Tribunal tem decidido que a ação popular é instrumento hábil na defesa da moralidade administrativa, ainda que não exista dano econômico material ao patrimônio público. Além disso, as instâncias ordinárias, na análise dos fatos, chegaram à conclusão de que a obra trouxe prejuízo ao erário por ser construção sem infraestrutura, com sérios problemas de erosão no local etc. Diante do exposto, a Turma não conheceu do recurso. Precedentes citados do STF: RE 170.768-SP, DJ 13/8/1999; do STJ: REsp 474.475-SP, DJe 6/10/2008, e REsp 172.375-RS, DJ 18/10/1999. REsp 1.130.754-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 13/4/2010.



Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Patrimônio Público Municipal – 1

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário, afetado ao Pleno pela 2ª Turma, em que se discute a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público para promover ação civil pública em defesa do patrimônio público municipal, nos termos do art. 129, III, da CF (“São funções institucionais do Ministério Público: … III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;”) — v. Informativo 567. Na espécie, tribunal de justiça desprovera apelação interposta pelo parquet estadual para manter sentença que indeferira liminarmente petição inicial, por entender que o dispositivo constitucional em comento não dera à ação civil pública a amplitude pretendida pelo órgão ministerial. O Min. Eros Grau, relator, desproveu o recurso por entender que o Ministério Público não teria legitimidade para exigir, em ação civil pública, o que poderia vir a ser objeto de ação popular (CF, art. 5º, LXXIII).

Considerou, inicialmente, que a ação popular, proposta por qualquer do povo, desde que cidadão eleitor, objetivaria a tutela jurídico-processual de direitos subjetivos meta-individuais, assinalados na Lei 4.717/65. De modo diverso, observou que a ação civil pública respeitaria à tutela de interesses difusos e coletivos (proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos). Salientou que não haveria, no caso dos autos, interesse difuso e coletivo sendo protegido, na medida em que se objetivaria a anulação de contrato de compra de imóvel e a afirmação de pretenso direito ao ressarcimento de danos ao patrimônio público municipal. Enfatizou que a presente ação não visaria à salvaguarda de direitos difusos, mas à satisfação de interesses cujo titular seria o município. Ressaltou que a atuação do parquet haveria, porém, de estar restrita à defesa dos interesses indisponíveis da sociedade (CF, art. 127). Sustentou, no ponto, que os direitos os quais a Administração exerce ao celebrar contratos não poderiam ser concebidos como indisponíveis, visto que o ato de contratar, ainda quando por ela praticado — observada a forma da lei — seria exercido livremente. Asseverou, ademais, incumbir ao órgão ministerial exercer outras funções exclusivamente quando compatíveis com a sua finalidade, nos termos do que dispõe o art. 129, IX, da CF. Frisou que a atuação processual do Ministério Público resultaria juridicamente possível somente nas ações de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, à ordem urbanística, a qualquer outro interesse difuso ou coletivo e por infração à ordem econômica e à economia popular. Destacou que, para a tutela do erário, a Constituição previu instrumento processual específico no seu art. 5º, LXXIII, qual seja, a ação popular.

Afirmou, assim, encontrar duas razões a hostilizar irremediavelmente os argumentos de quantos admitam compatível com a Constituição ação civil pública análoga ou com o mesmo objetivo da ação popular. De início, assentou que os dois institutos, ação popular e ação civil pública, não se superporiam no plano constitucional, a primeira dizendo com os direitos e deveres individuais e coletivos (CF, art. 5º, LXXIII) — direitos subjetivos meta-individuais —, a segunda sendo desdobrada das funções do Ministério Público (CF, art. 129, III), atinentes a interesses difusos ou coletivos, indivisíveis e indisponíveis. De uma resultaria a restituição de pecúnia ao erário; de outra, a reversão da condenação em dinheiro a um fundo gerido por um Conselho Federal e por Conselhos Estaduais. Em seguida, consignou a circunstância de essa condenação em dinheiro (Lei 7.347/85, art. 13) não corresponder à restituição de pecúnia ao erário. Registrou que, no caso, se pretenderia, como se verifica do pedido formulado pelo parquet, algo que não seria próprio a uma ação civil pública. Após, pediu vista o Min. Dias Toffoli.


Art. 37, § 1º, da CF e Promoção Pessoal – 1

A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão de tribunal de justiça que mantivera sentença que julgara procedente pedido formulado em ação popular ajuizada contra prefeito, por afronta aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa (CF, art. 37, § 1º), em razão do uso de símbolo e de slogan político-pessoais nas diversas formas de publicidade e/ou divulgação de obras e eventos da prefeitura. O então prefeito reitera a alegação de ofensa ao art. 37, § 1º, da CF, porquanto a interpretação dada pela Corte de origem ao referido dispositivo constitucional, que não menciona o vocábulo slogan, seria errônea ao considerar a utilização de um símbolo — o elo de uma corrente — e o slogan “unidos seremos mais fortes” como conflitantes com o aludido artigo. Aduz ser possível a conclamação do povo por meio de palavras de ordem e afirma, ainda, que o símbolo por ele utilizado fora criado por artista local e escolhido em concurso para dar significado à frase de exortação (slogan), não se enquadrando, pois, na vedação constitucional.


O Min. Gilmar Mendes, relator, proveu o extraordinário para julgar improcedente a ação popular ao fundamento de que o acórdão impugnado aplicara equivocadamente o disposto no referido art. 37, § 1º, da CF, violando-o. Inicialmente, asseverou que, no caso, tratar-se-ia de valoração das provas produzidas nos autos e não de seu reexame. Em seguida, reputou que, da mesma forma que se poderia proceder à leitura do símbolo e do slogan de acordo com aquela feita pelo recorrido/autor popular, a saber, a letra “H” e sua conexão com o adjetivo “fortes” usado na frase do slogan (“unidos seremos mais fortes”) que, segundo ele, constituiria uma associação direta ao nome do recorrente, também seria perfeitamente possível, de maneira legítima, interpretar-se o mesmo símbolo como se um elo de corrente representasse, e à leitura do mesmo slogan como se diretamente relacionado à função do elo da corrente, ou seja, à união que leva à força. Tendo isso em conta, entendeu que as provas colacionadas, por si sós, seriam insuficientes para caracterizar a promoção pessoal do recorrente. Após o voto do Min. Joaquim Barbosa que, na linha da jurisprudência do STF, não conhecia do recurso por demandar reexame de provas, pediu vista o Min. Cezar Peluso.


Pensão Vitalícia a Viúva de Ex-Prefeito – 3
A Turma retomou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que, em ação civil pública proposta pelo Ministério Público estadual, considerara imoral e lesiva ao patrimônio público a Lei municipal 825/86, a qual instituiu pensão vitalícia a viúva de ex-prefeito, e condenara solidariamente o prefeito que sancionara a lei, os vereadores que a aprovaram e a viúva a restituir ao erário os valores recebidos. Sustenta-se, na espécie, ofensa aos seguintes artigos da Constituição: a) 5º, XXXVI, haja vista ação popular com o objetivo de anular a referida lei, julgada extinta com exame de mérito; b) 29, VIII, tendo em conta a inviolabilidade dos vereadores pelas opiniões que proferem no exercício de suas funções; c) 102, I, a, por ter o acórdão recorrido declarado a nulidade da lei municipal; e d) 129, III, em razão da ilegitimidade do Ministério Público para figurar no pólo ativo de ação civil pública em que se pretende o ressarcimento de dano ao erário em face da prática de improbidade do administrador — v. Informativo 432.


O Min. Eros Grau, em voto-vista, iniciou divergência e deu provimento ao recurso. Inicialmente, observou que a Lei municipal 825/86, embora materialmente consubstancie um ato administrativo, na realidade configura uma lei-medida, lei apenas em sentido formal, lei que não é norma jurídica dotada de generalidade e abstração, que não constitui preceito primário — no sentido de que se impõe por força própria, autônoma —, algo análogo ao que a Constituição prevê no seu art. 37, XIX e XX (ato administrativo especial). Daí a impropriedade de se afirmar, no caso, violação do princípio da moralidade. Em seguida, asseverou que este princípio haveria de ser encontrado no interior do próprio direito, até porque a sua contemplação não poderia conduzir à substituição da ética da legalidade por qualquer outra. Destacou que o sistema jurídico tem de recusar a invasão de si próprio por regras estranhas a sua eticidade própria, advindas das várias concepções morais ou religiosas presentes na sociedade civil. Nesse sentido, frisou que o questionamento da moralidade da Administração estaria confinado nos lindes do desvio de poder ou de finalidade e que qualquer controvérsia para além desses limites estaria sendo postulada no quadro da legalidade pura e simples. Destarte, concluiu que a concessão à viúva de pensão vitalícia equivalente a 30% dos vencimentos de prefeito não consubstanciaria desvio de poder ou de finalidade. Aduziu, por outro lado, que ou se deve aceitar a existência, no caso, de lei em sentido formal — lei inserida no ordenamento jurídico local a incidir o art. 29, VIII, da CF — ou tratar a concessão da pensão sob análise absolutamente como ato administrativo. Evidenciou ser descabida a sujeição da lei municipal de que se cuida à incidência do disposto no art. 37 da CF/88, dado que a Lei municipal é de 1986, não podendo esse dispositivo retroagir para acolhê-la. Salientou, ademais, que esta Corte já se manifestou no sentido da constitucionalidade das chamadas pensões especiais.


Mencionou, ainda, não visualizar nas condutas de integração do processo legislativo desvio de poder ou de finalidade, menos ainda uma arbitrariedade legislativa, na medida em que a lei municipal de que se trata não seria expressão da vontade pura e simples do Legislativo local, encontrando base material de apoio na Constituição (art. 3º, I). Assentou, também, que a concessão de pensões especiais em situações análogas à examinada seria corriqueira, sem que essa prática tenha sido concebida como expressiva de arbitrariedade ou de desvio de poder ou de finalidade. No tocante à imunidade parlamentar dos vereadores por suas opiniões, palavras e votos (CF, art. 29, VIII), não vislumbrou como possa um vereador praticar delito contra a honra ao votar alguma deliberação na Câmara Municipal. Entendeu que, na presente situação, a inviolabilidade dos vereadores por seus votos afastaria a responsabilização indenizatória solidária, com imposição da devolução ao erário do recebido. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.



O recorrente afirma que o testamento é fruto de fraude perpetrada pelos réus e, diante da inexistência de herdeiros legítimos, a valiosa herança (cerca de sessenta imóveis) ter-se-ia por jacente, devolvendo-se o acervo hereditário à respectiva municipalidade. A questão refere-se ao cabimento de ação popular no caso em que se pretende anular testamento por suposto vício de consentimento. No caso, não obstante tratar-se de ação popular, o fato é que a relação em litígio é eminentemente de ordem privada, pois se litiga sobre a nulidade de um testamento. O interesse da Administração Pública é reflexo, devido à possível conversão da herança em vacante. Para que o ato seja sindicável mediante ação popular, ele deve ser, a um só tempo, nulo ou anulável e lesivo ao patrimônio público, no qual se incluem os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Com efeito, mostra-se inviável deduzir em ação popular pretensão com finalidade de mera desconstituição de ato por nulidade ou anulabilidade, sendo indispensável a asserção de lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público. No caso, como já dito, pretende-se a anulação de testamento por suposta fraude, sendo que, alegadamente, a herança tornar-se-ia jacente. Daí não decorre, todavia, nem mesmo em tese, uma lesão aos interesses diretos da Administração. Isso porque, ainda que prosperasse a alegação de fraude na lavratura do testamento, não haveria, por si só, uma lesão ao patrimônio público, porquanto tal provimento apenas teria o condão de propiciar a arrecadação dos bens do falecido, com subsequente procedimento de publicações de editais. A jacência, ao reverso do que pretende demonstrar o recorrente, pressupõe a incerteza de herdeiros, não percorrendo, necessariamente, o caminho rumo à vacância, tendo em vista que, após publicados os editais de convocação, podem eventuais herdeiros apresentar-se dando-se início ao inventário nos termos dos arts. 1.819 a 1.823 do CC/2002. Ademais, nem mesmo a declaração de vacância é em si bastante para transferir a propriedade dos bens ao Estado, uma vez que permanece resguardado o interesse dos herdeiros que se habilitarem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 1.822 do CC/2002. Diante disso, a Turma conheceu parcialmente do recurso especial e lhe deu provimento, apenas para afastar a multa aplicada na origem. REsp 445.653-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2009.



o município figurou como réu na ação popular, mas requereu seu ingresso na lide na qualidade de litisconsorte, obtendo o deferimento do juízo monocrático. Foi contra essa alteração subjetiva nos polos da relação processual que o agravante interpôs o recurso de apelação e, posteriormente, ingressou com recurso especial. O Min. Relator entendeu que não há como dar provimento ao recurso da agravante, pois a conduta da municipalidade encontra amparo no § 3º do art. 6º da Lei n. 4.717/1965. Assim, segundo a lei, a pessoa jurídica de Direito Público chamada na ação poderá contestá-la ou não, ou poderá encampar o pedido do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo exclusivo do representante legal da entidade. Dessa forma, dois são os requisitos que o dispositivo legal exige para que a pessoa jurídica de Direito Público possa requerer a alteração no polo da lide: que o pleito seja realizado dentro do prazo da contestação e exista interesse público. 

No caso, os requisitos legais foram atendidos de forma satisfatória. O requerimento para figurar no polo ativo da relação processual foi exercido dentro do prazo para o oferecimento da contestação, não havendo falar em preclusão lógica ou temporal em razão de a entidade de Direito Público ter pleiteado, nos termos do art. 7º, IV, da Lei n. 4.717/1965, o prazo em dobro para responder à ação. Até porque, esse pedido do município não quer dizer que ele praticou ato incompatível com a faculdade de requerer o ingresso no polo ativo da relação processual. A incompatibilidade só teria ocorrido se, efetivamente, a municipalidade tivesse apresentado contestação. Ademais, em nenhum momento, a lei da ação popular estabeleceu a incompatibilidade entre o requerimento de prazo em dobro para contestar, conforme o mencionado artigo da referida lei, e a faculdade estabelecida no art. 6º, § 3º, da mesma lei, que permite ao ente público pleitear o ingresso no polo ativo da demanda. Assim, no silêncio da lei, não cabe fazer interpretações restritivas, mormente quando se está diante de uma garantia constitucional posta à disposição do cidadão para a defesa do patrimônio público. De outro lado, o interesse jurídico da municipalidade é palmar. O objeto da ação popular é a anulação de aditamento do contrato em face de supostas irregularidades ocorridas em processo de licitação, que teriam ocasionado a lesão não só ao patrimônio público, mas também a princípios mestres do sistema de Direito Administrativo, entre os quais a legalidade, a moralidade e a isonomia. Portanto, é completamente descabida a afirmação da agravante de que o interesse do município para figurar no polo ativo da ação popular é meramente econômico. Ainda que eventual condenação ao pagamento de quantia seja revertida ao município, isso não quer dizer que o interesse público não esteja presente em tal situação, principalmente quando a condenação é consequência de atos que lesaram o patrimônio público e violaram os princípios norteadores do Direito Administrativo. Diante disso, a Turma negou provimento ao agravo. AgRg no REsp 973.905-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/6/2009.



In casu, entidade integrante da Administração Pública indireta recusou-se a comprar terreno de pessoa física oferecido pelo valor de CR$ 1.800.000,00 na época. Três meses após, empresa concessionária de veículos adquiriu o terreno por CR$ 1.500.000,00. No mês subsequente, a referida entidade firmou com essa empresa contrato de compra do mesmo terreno no montante de CR$ 6.724.170,00. Daí a proposição de ação popular pelo ora recorrente, objetivando a declaração de nulidade da compra e venda do imóvel ou a condenação dos réus à reposição ao erário da importância de CR$ 5.224.170,00, corrigida e acrescida de perdas e danos. O tribunal de origem anulou a sentença que julgava procedente o pedido, pois entendeu ser necessária a produção de prova pericial para aferir se houve lesão ao patrimônio público. Diante disso, a Turma deu provimento ao REsp ao entendimento de que é dispensável a prova pericial determinada pelo tribunal a quo,pois não há como afastar a lesividade na aquisição de terreno quando se verifica que, em espaço de tempo inferior a um semestre, a entidade em causa o recusou para, logo depois, tornar-se sua proprietária pagando quantia superior a aproximadamente quatro vezes o valor original. Ressaltou-se que a premissa estabelecida de que haveria necessidade de realização de prova pericial e, por consequência, da nulidade da sentença, ganha maior relevo na hipótese dos autos, que já tramitam por prazo superior a trinta anos, em manifesta contrariedade ao princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF/1988, com a redação conferida pela EC n. 45/2004). REsp 806.235-ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 26/5/2009.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...