Se o réu não deu causa à perda de provas e
não é possível avaliar o montante do dano causado, a única solução é
fixar a indenização no limite que pode ser calculado com grau aceitável
de certeza. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que rejeitou arbitramento de danos materiais embasado
apenas em presunções.
Os ministros analisaram caso em que a
TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A foi condenada por exibir uma menor de 15
anos trocando de camiseta em um estádio de futebol, expondo
acidentalmente seus seios, em reportagem do programa “Aqui Agora”, em
1991. A matéria teria sido, alega-se, exibida repetidas vezes ao longo
da programação, em tom jocoso, causando constrangimento à menor.
O
SBT não questionou os danos morais nem os materiais relativos à
reportagem, que somam mais de R$ 200 mil, mas não aceitou a condenação
relativa às chamadas comerciais do programa. Isso porque, como a ação só
foi movida anos depois, após a maioridade da autora, a emissora não
detinha mais cópias das fitas, que foram reutilizadas.
Estimativas
A
reportagem tinha 55 segundos no total, mas a imagem da menor teria sido
usada por oito segundos. Porém, como as gravações não existiam mais,
houve dificuldade para fixar o valor dos danos materiais. O SBT afirmou
que na semana dos fatos foram veiculados seis programas “Aqui Agora”,
com inserção de oito segundos das imagens da autora em cada um deles.
Informou, também, que depositou valor superior a R$ 115 mil em juízo.
A
vítima, ainda em primeiro grau, argumentou que o cálculo não estaria
correto, porque não considerava o tempo em que sua imagem foi usada
durante as chamadas comerciais do programa. Além disso, pediu que fosse
levado em conta o tempo total da reportagem, não apenas os oitos
segundos em que aparecia.
Proporção
O
juiz da causa considerou apenas os oito segundos de efetiva exibição da
imagem e determinou que a autora fosse indenizada também pelas chamadas
para o programa. Ele contou o tempo total de exposição da imagem da
menor em todo o programa “Aqui Agora” e, aplicando-o proporcionalmente,
calculou que sua exposição em cada chamada de 15 segundos havia sido de
0,594 segundos. O número de chamadas veiculado em cada dia foi
estabelecido com base na quantidade que o “SBT Repórter” tem atualmente.
Ambas as partes recorreram.
O Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) aumentou a indenização ao afastar a estimativa de 0,594 segundos
de exposição da menor durante as chamadas comerciais e fazer o cálculo
pelo total dos flashes, 15 segundos. Nos demais pontos, o arbitramento foi mantido.
Recurso especial
Insatisfeito,
o SBT recorreu ao STJ, alegando que foi obrigado a produzir provas
negativas nos autos. Também afirmou que o juízo de primeiro grau
constatou que os rolos originais nos quais estavam registradas as
chamadas do programa “Aqui Agora”, assim como as fitas com a gravação do
próprio programa, foram perdidos e que seria impossível saber com
segurança o número exato de exibições da imagem da autora.
A
ministra Nancy Andrighi entendeu que ficou encerrada qualquer
possibilidade de arbitramento da indenização depois dos pagamentos já
realizados pela emissora, de cem salários mínimos por danos morais e de
R$ 115 mil pelas seis exibições de oito segundos a título de danos
materiais. Segundo a relatora, depois disso, o montante passou a ser
estabelecido por meio de “meras estimativas do juízo”.
Mar de presunções
Ela
afirmou que, no critério estabelecido em primeiro grau, “há muitas
dúvidas e só uma certeza: a de que, por melhor que seja a intenção do
juízo, o critério por ele adotado não reflete a realidade, à medida que
nada, na televisão, acontece em apenas 0,5 segundo. Navega-se,
claramente, num mar de presunções e estimativas”.
Segundo a
relatora, o tribunal local também errou, pois “corporificou a
indenização pelo mesmo processo de presunções, mas foi além: estabeleceu
o tempo de exposição da imagem da autora em 15 segundos por flash,
como se em todas as chamadas do programa ‘Aqui Agora’, em toda a
programação do SBT, a figura da autora com os seios de fora fosse
exposta durante todo o tempo, ininterruptamente. Aliás, por esse
raciocínio, a exposição da autora durante os flashes do
programa, de 15 segundos, seria maior que sua exposição na própria
reportagem, que tem apenas oito segundos. Também é uma estimativa que
claramente se afasta da realidade”.
Com fundamento em regra
contida no CPC de 1939, a ministra Andrighi extinguiu a liquidação sem
resolução de mérito quanto à parcela relativa às chamadas do programa.
Porém, facultou à autora reiniciar a liquidação, caso reúna provas de
veiculação dos flashes e da extensão da exposição de suas imagens neles. A Terceira Turma acompanhou o voto da relatora de forma unânime.
Nenhum comentário:
Postar um comentário