quinta-feira, 5 de maio de 2016

Afastamento do Presidente da Câmara Eduardo Cunha

Sabia quais foram as razões jurídicas que fundamentaram o afastamento preventivo do Presidente da Câmara Eduardo Cunha.

STF afastamento de Eduardo Cunha


Hoje, dia 05/05/2016, o Presidente da Câmara Eduardo Cunha foi afastado de seu mandato parlamentar através de decisão liminar proferida pelo Min. Teori Zavascki nos autos da Ação Cautelar de n.º 4.070. O Presidente da Câmara além de ser alvo de vários inquéritos junto ao STF responde ainda uma ação penal que está próxima de ser julgada de forma definitiva pelo plenário do Supremo. 

O art. 53, §2 da CF é taxativo ao afirmar que os parlamentares federais somente poderão ser presos em caso de flagrante em crime inafiançável. Observa-se que não há menção a prisão preventiva ou mesmo a aplicação de outra medida cautelar diversa da prisão, como por exemplo, o afastamento do mandato parlamentar.

Art. 53 § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

Em outras palavras, nos termos da CF, o parlamentar federal somente poderia ser preso em caso de sentença condenatória com trânsito em julgado ou em caso de flagrante delito nos crimes inafiançáveis. Naqueles casos em que a prisão decorre de uma medida provisória/cautelar (prisão preventiva, temporária ou outras medidas cautelares diversas da prisão) não seria admitida a utilização de instrumentos processuais penais com a finalidade de tutelar a aplicação da lei penal ou impedir a reiteração criminosa. 



É importante frisar que a prisão em flagrante já não tem natureza jurídica de prisão cautelar, visto que em razão das alterações efetuadas no Código de Processo Penal pela Lei 12.403/11 ela assume o caráter de medida pré-cautelar já que deve ser convertida imediatamente em prisão preventiva, nos termos do art. 310, II do CPP. Ela não é mais uma medida autônoma de modo que sempre estará relacionada e dependente a outra medida cautelar. 



Essa posição foi didaticamente demonstrada pelo Min. Celso de Mello no julgamento do Inq 510, verbis:



O exercício do mandato parlamentar recebeu expressiva tutela jurídica da ordem normativa formalmente consubstanciada na Constituição Federal de 1988. Dentre as prerrogativas de caráter político-institucional que inerem ao Poder Legislativo e aos que o integram, emerge, com inquestionavel relevo jurídico, o instituto da imunidade parlamentar, que se projeta em duas dimensões: a primeira, de ordem material, a consagrar a inviolabilidade dos membros do congresso Nacional, por suas opinioes, palavras e votos (imunidade parlamentar material), e a segunda, de caráter formal (imunidade parlamentar formal), a gerar, de um lado, a improcessabilidade dos parlamentares, que só poderao ser submetidos a procedimentos penais acusatorios mediante previa licenca de suas Casas, e, de outro, o estado de relativa incoercibilidade pessoal dos congressistas (freedom from arrest), que só poderao sofrer prisão provisoria ou cautelar numa única e singular hipótese: situação de flagrancia em crime inafiancavel. - Dentro do contexto normativo delineado pela Constituição, a garantia jurídico-institucional da imunidade parlamentar formal não obsta, observado o "due process of law", a execução de penas privativas da liberdade definitivamente impostas ao membro do Congresso Nacional. (Inq 510 / DF – DISTRITOFEDERAL).

A redação do art. 53 §2 da CF merece críticas. Esse dispositivo foi incluído no texto da Constituição pelo constituinte originário (não houve modificações significativas com a EC 35/2001) com o fito de coibir perseguições políticas em face dos parlamentares como, de fato, ocorreu no regime militar. Essa garantia teve sua razão de ser dentro daquele contexto social que já não mais subsiste nos dias atuais quando a democracia brasileira já se concretizou e uma grande parcela de políticos utilizam seu mandato para praticar os mais variados crimes, notadamente aqueles em prejuízo a Administração Pública.



Consideradas essas premissas, quais motivos fundamentaram o afastamento do Presidente da Câmara Eduardo Cunha? 



Os argumentos (fundamentos) utilizados para o afastamento são os seguintes:

a) A possibilidade fática de Eduardo Cunha assumir o cargo de Presidente da República nos casos de impedimento de Vice-Presidente Michel Temer, uma vez afastada temporariamente a então Presidente da República Dilma Rousseff pela decisão de admissibilidade do Senado Federal no processo de impeachment que tramita nessa casa legislativa.

Com fulcro no art. 79 da CF, naqueles casos em que houver a vacância (impeachment, por exemplo) do cargo de Presidente deve o Vice-Presidente assumir. Assim, naturalmente, pela linha sucessória prevista no art. 80 da CF caberá ao Presidente da Câmara de Deputados exercer o mandato de Vice-Presidente e nos casos de impedimento do Presidente da República caberá exercer a chefia de Governo e de Estado. 
Art. 79. Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente. 
Art. 80. Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.
Em um paralelo ao art. 86 da CF que prevê que o Presidente da República seja afastado do seu cargo quando recebida a denúncia nos crimes comuns pelo STF, o Min. Teori entendeu que seria uma condição necessária ao exercício do mandato de Presidente da República que aquele que assuma o cargo de chefe do executivo, mesmo que temporariamente, não responda ações criminais. 
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.
O Min. Teori conclui então:
Os ocupantes de cargos integrantes da linha sucessória da Presidência da República jamais poderão exercer o encargo de substituição caso estejam respondendo a processos penais 
Mencionou-se ainda que esse posicionamento não afronta o princípio da não culpabilidade, visto que ele seria idôneo a proteger a própria função pública. 

b) Os fatos atribuídos ao réu Eduardo Cunha são devidamente adequados ao descrito no art. 282, I e II do CPP. Não obstante a Constituição não permite a prisão cautelar do parlamentar, o Min. Teori fez a subsunção dos fatos atribuídos ao Presidente da Câmara à legislação processual penal. 

Art. 282.As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

c) Enfatizou-se que além do controle de constitucionalidade exercido pelo Supremo, cabe ao STF zelar pelo fiel exercício das obrigações dos mandatos parlamentares, os quais não estariam inumes a jurisdição do Tribunal Constitucional. 


d) Não obstante a ausência de previsão constitucional expressa sobre o afastamento de parlamentares, no caso em que ele seja processado criminalmente seria legítimo a suspensão de suas funções públicas com fulcro no art. 319, VI do CPP. 


Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).


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